O ano a terminar

Preciso de escrever aqui que já não posso voltar atrás um só dia mas gostaria mesmo de ter sido melhor pessoa no ano que termina. 

Uma coisa que me altera muito é a vivência da maternidade; senti-me muitas vezes a pessoa complicada na vida da minha filha e isso é terrível. Embora ela me diga muitas vezes e com facilidade que me ama (nos últimos dias, desde que aprendeu, é i love you em modo papagaio), embora me derreta a alma quando me diz que quando for grande quer ser uma mamã como eu, eu sei com certeza absoluta que poderia ter sido e feito melhor ao longo deste 2023.

Também não fui uma amiga presente, de todo. Mas muitas vezes não pude com o cansaço, foi isso. Deixei algumas pessoas um bocadinho para trás em 2023, e penso nessa gente nestes últimos dias de reflexão.

Não li, não li! Um ano inteiro sem arranjar tempo para ler. Uma péssima sensação de ter sido fraca gestora daquilo que de mais precioso temos, e que todos temos: o nosso tempo.

Céus, quase não namorei! E juro-vos que amo o Luís mais do que nunca.

Há uma coisa que me incomoda mesmo e que já não vou conseguir fazer: limpar os quatro cantos da minha casa e entrar no novo ano com espaço e frescura. Só espero conseguir fazê-lo ao longo de Janeiro e ainda ir a tempo de atrair coisas boas para o novo ano.

Tenho bons pressentimentos para 2024. E que Deus nos ajude.

Contas que não batem certo

Tanta vacina, tanto reupeupeu, e está meio mundo de molho com uma coisa que antes se chamava gripe e agora se chama doença perigosa.

Foi assim o nosso Natal

 


Começou com a alegria imensa de ganhar este presépio como prenda de Natal da minha filha. Achei simples, ternurento, engraçado de tal maneira que partilhei a imagem com meio mundo. Achei que ia guardá-lo pela vida inteira. Mas não. Na manhã da véspera de Natal, a minha filha lembrou-se de me dar o primeiro desgosto da nossa história de mãe-filha: comeu o presépio! Fiquei triste, zangada, indignada, enfim fritei mesmo a pipoca no meu quinto piso. Mas é isso mesmo a vida, aprender a relevar. Afinal a miúda apenas comeu uns amendoins, só isso. Já anda a comer os chocolates da árvore de Natal há tantos dias, que comer o presépio não deve ter sido nada absurdo para ela. Anyway o verdadeiro presépio é aquele que cada um de nós consegue trazer dentro do coração: tive que me agarrar às boxes e digerir a situação.
Depois foi aquela canseira típica destes dias, que eu senti mesmo não tendo sofrido na pele a azáfama da cozinha: abençoada sogra. E uma tristeza miudinha que se encostou a mim já há vários dias, que eu nem sei bem porquê mas espero mesmo que este modo Florbela Espanca não entre comigo em 2024: sai encosto! Depois na noite da consoada foi muito giro ver a alegria da minha filha com os presentes. O avô vestiu-se de Pai Natal e ela embora tenha topado logo que era o avô, entrou no jogo e tratou-o mesmo como se fosse o verdadeiro Santa Claus. Fiquei com pena de nós, acho que a miúda não nos quis decepcionar nas nossas expectativas e ansiedades natalinas. Após abrir 24 presentes (eu sei, insano!), fez uma birra porque o Pai Natal não lhe trouxe um dinossauro gigante e castanho. Calma, não foi que ninguém se lembrou, foi mesmo que ninguém sabia que ela queria tal coisa. De resto foi muito sossegado e oxalá pudesse ser assim o resto da minha vida. 
Ah, claro: senti uma falta dolorosa, imensa, dos braços da minha mãe. Uma nostalgia por causa daqueles natais bem pobres, com os meus irmãos, juntos para o que desse e viesse. Uma dor fininha por sentir que nunca mais vamos voltar a estar todos juntos.
A coisa mais fora da caixa, for ter comido tremoços (pela primeira vez este ano) na semana das festas; foi nem sequer ter comido grande coisa de doçarias. Foi perceber que estou farta da minha decoração de Natal cá de casa e que num Natal muito próximo a mudança vai de fio a pavio. Foi a Maria ter ido ao Circo com o avô e voltar para casa traumatizada: um dia conto-lhe que sempre detestei Circo. Foi o meu Luís ter-me abraçado e tolerado 758 vezes o meu mau humor porque trabalho sete dias seguidos até ao novo ano e ando piurça por levantar o lombo da cama todos os dias às cinco horinhas da madrugada, com este frio, tão bom! Foi ver a minha filha dizer as horas a alguém na rua pela primeira vez na vida dela. Foram aqueles dias lindos lindos de céu azul e sol tremendo a encher-nos de boa vibe. Foi pagar mais de cinquenta euros por um simples pão de ló e um bolo rei! Para o ano vamos ao Lidl que acho mesmo que o mundo enlouqueceu. Foi ouvir a minha menina cantar canções de Natal no coro da Igreja, e no Hospital.
(...)
Ufa, chega, não vos conto mais.

Gosto tanto


Quem disse 2023? 
2024.

Doze dias depois do ultimo post

Continuo a sentir-me mal. E continuo a comer açucares. Ando com a desculpa típica dos que empurram com a barriga: "depois das festas".

Ando mais sensível; tenho visto uma data de coisas nos últimos dias que mexem tanto comigo que fico em modo compensação. E depois o Natal. Tudo em roda viva, um stress que nunca foi aconselhado pelo menino Jesus. A miúda doente, com uma virose que agora os médicos já nem precisam de estudar para dar nome às coisas. Relações fingidas que só nos cansam e envelhecem, na selva que é o mundo lá fora. Falta de tempo para levar uma lembrança de Natal a todos os que realmente gostaria de presentear. Nesta lista de desculpas para comer açucares importa dizer que tenho-me estado mais ou menos a borrifar para tudo, menos para a Maria e o Luís. Tenho dormido como um bicho que hiberna, eu e a baby enroscadinhas uma na outra até às 11h da manhã, sempre que podemos, sempre que nos apetece, que nestes dias tão frios é mais ou menos todos os dias.

Mesmo assim, já peso menos de 65kg (faltam 10!). E nem sequer é uma vitória mas já que tenho barriga vou mesmo aproveitá-la: "para o ano falamos sobre isso".

(...)

Dieta

Não me tenho sentido nada bem, em termos de saúde física. Não é por causa do Natal, é por causa de todos os outros dias em que cometo agressões alimentares a mim mesma, que começo hoje a fazer um esforço extra para simplificar cuidando um pouco mais de mim. Tenho um problema grave com os açúcares, são a minha droga. Preciso de assumir esta verdade antes que seja tarde demais. E preciso sobretudo de reeducar a Maria neste sentido, porque é bem verdade que os filhos são o espelho dos pais.

Mas é porque não quero morrer de repente, nem devagar. Não quero morrer tão cedo. Seria terrível fazer uma coisa dessas à Maria: perceber que não estou bem, e continuar.

Sobre o dia de ontem

Aos 45 ainda não aprendi que é vivendo mais a sério o nosso mundo interior que retiramos importância ao mundo cá fora, um mundo que às vezes nos parece fútil e de desimportância e que nos magoa. Ontem, dia do Imaculado Coração da Rainha, em vez de aproveitar a oportunidade da alegria de um dia só com Ela e com a minha filha - a minha maior benção, vivi o dia focada no que não tinha e em quem não estava. 

A vida às vezes é bem mais simples. Esta é uma das lições que quero levar comigo para 2024.

Quase Natal


Vamos distraídos, numa marcha cá dentro a atravessar muitos dias cinzentos e a encontrar com espanto algumas noites iluminadas. Gostaria de um dia conseguir sentir com certeza que estou à altura de todas as bênçãos e amor imenso com que Deus e a Mãe me presentearam.
Mas eu sou assim. De repente fico triste.
Hoje é dia da Mãe. Não há nada que pudesse ser mais importante do que aquilo que ganhei de presente: um dia inteiro na companhia da minha filha, e ela bem.
De resto é quase Natal, e eu só preciso de encontrar a magia dentro de mim.

Para ti Luís


Para te lembrar que cada domingo juntos que desperdiçamos, não volta mais.

Tão bom

Comove e transforma

Dezembro

Um mês de tanto Amor. Só é pena ser feito de tanta correria também.

Às vezes quero só ficar em modo slow e contrariar toda esta parafernália à minha volta. Mas não consigo. Horários de trabalho malucos, a dormir três horas entre um turno e outro. Uma miúda de três anos a escapar-me pelos dedos, rainha das birras e do eu quero posso e mando (sim, já sei: sou eu a culpada). Compras para fazer, pouco dinheiro para gastar e quase tempo nenhum (e paciência nenhuma também). Solicitações normais de amigos e eu sempre com a mesma conversa: não tenho tempo. Luís a viver num planeta e eu noutro (pode ser que a gente se encontre lá para o Natal). O não poder dar um abraço à minha mãe, que além de ser Natal é também o mês de aniversário dela.

Anyway consegui levar a Maria a ver a árvore de Natal gigante na baixa da cidade. Escusado será dizer que ela teria ficado a viver ali naquele momento até ao próximo Verão, pois claro. Assistimos os três a um concerto, o primeiro concerto dela, e dançamos e rimos a sério os três juntos. Comi finalmente castanhas quentinhas e senti aquela magia única de estar junto ao vendedor de castanhas numa noite muito fria e iluminada, já a cheirar tanto a Natal. Foi tão bom, queremos mais.

(...)


Numa altura em que tanta coisa falha no nosso país tão pequenino - é preciso não esquecermos que é à beira-mar plantado - salvam-nos estes heróis que não me canso de ouvir. Temos tanta excelência, nos mais novos e nos mais velhos. E vê-los dar a mão uns aos outros, confesso que me enche de conforto e de esperança. Ainda há quem queira de verdade deixar o nosso mundo melhor.

Novembro

Nasceu um menino muito especial.

O Tomé comove-me. Estávamos à espera dele há muito muito tempo.

(...)

22 de Novembro de 2023

Os meus 45 anos:

Comecei pelo milagre de estar viva.

Ganhei um dia muito frio, de céu azul e sol brilhante: os mais bonitos do ano para mim.

Tomei o meu café da manhã numa confeitaria que gosto muito, sozinha, sossegada.

Senti o cheiro das primeiras rabanadas de Natal á venda.

Ouvi nas noticias que Israel e o Hamas fizeram um acordo.

Comprei um presente para a minha filha.

Fiz uma caminhada a pé, em modo de oxigenar as ideias.

Estreei um abrigo quentinho.

Ganhei muitos beijos e abraços do meu Luís e da minha Maria.

Comprei uma coroa de Natal para oferecer.

Recebi presentes maiores: fotografias e muita emoção.

Senti que está tudo certo.

Fiz só o que gosto, e com tempo.

Ganhei flores, das minhas preferidas: tulipas e girassóis.

Às pessoas - as minhas pessoas - a minha gratidão profunda por me fazerem tão feliz neste meu dia.

Obrigada Sara



Não fui das pessoas que gostou do trabalho da Sara Tavares desde o inicio. No entanto reconheci-lhe sempre uma doçura particular na voz, quase uma espécie de encantamento, de bálsamo. Mas trabalhos musicais que me ficassem, surgiram mais tarde. Os dois que partilho neste post são do melhor para mim. Acho que com o passar dos anos foi ficando mais cantora e mais bonita também.
Esta noite acordei às 5h da madrugada porque a Maria quis fazer um xixi. Fiquei sem sono e resolvi espreitar as noticias. Nem sequer sabia que a Sara estava tão doente. Fiquei tão triste que não voltei a adormecer.
Faleceu com 45 anos, exactamente a idade que vou cumprir esta semana. 

Sobre o nosso mundo

Não acho que esteja a evoluir, acho só que se vai diversificando cada vez mais, com a palavra diversificar a ter para mim cada vez menos importância ou destaque. Não acho graça a concursos de beleza que sempre foram só sobre a mulher, deixarem de o ser. Não encontro vertente educativa ou outra qualquer de interesse, em ter programas da manhã na televisão a entrevistar com destaque casais abertos numa quase promoção direta do tão em voga poliamor. Não percebo nem quero perceber gente que se intitula de jornalista e atropela o respeito perseguindo pessoas de pijama na rua a passear o cão ou a levar a filha à escola; e não, não foram só os jornalistas do costume, há tantos na praça que hoje em dia se vendem por duas moedas, que até o Judas se vendeu por trinta. E não, não sou fã de Galambas nem afins. Não contrataria para meu governo ninguém com piercings nas orelhas e acho péssimo comparecer a uma reunião com o Presidente da Republica de calças de ganga e sapatilhas. Parece que de repente é tudo uma cambada de fixes. Morria de vergonha se a minha filha um dia adolescente andasse para aí a atirar tintas verdes à cara de ministros ou quem quer que fosse, ou destruísse obras de arte, a titulo de salvar o planeta. Acho que jovens inteligentes brilham de outra forma. Acho estranho e triste pessoas que tratam melhor os animais do que as pessoas; é só preciso tratar bem os animais, mais nada. Assusta-me ver a imagem de meninas de 12 anos tão sexualizada, como se a sensualidade fosse uma coisa de repente tão inocente. Este é cada vez mais um mundo cão, sem eira nem beira, onde algumas liberdades são para mim só bandeiras perigosas. Um mundo tão estranho onde aceitamos tudo menos que haja uma opinião diferente da nossa, que ao mesmo tempo a medo muitas vezes já nem sequer podemos expressar. Mas são só coisas minhas, venham as balas que eu posso bem com elas.

Procuro educar a minha filha na aceitação da diferença, seja ela qual for, numa perspetiva de igualdade e respeito.  Mas oxalá ela tenha ideias próprias e não me cresça só uma miúda parvinha e acéfala. Eu sou na verdade conservadora. E gosto de o ser, cada vez mais. Esta semana vi que agora é cool e muito à frente, em vez de ter a Nossa Senhora o o S. José no presépio, ter duas figuras masculinas. Mas onde é que isto vai parar? Nem sequer tenho já pachorra para um mundo tão dolentemente inclusivo. Dói o cotovelo, dói? Passa nívea! Tanta coisa realmente importante para ser discutida e o mundo distraído a jogar ao berlinde.

Sobre a importância das tradições em familia

Quero um dia ser uma mãe natal. Como tem sido a minha mãe toda a vida. Daquelas que fazem rabanadas, filhoses, aletria, roupa velha. Daquelas que três dias antes do natal já estão com a cozinha on fire e só cheiram a canela. Daquelas que decoram a casa porque é preciso, porque só assim é que é natal. Daquelas que colocam no pinheiro bolas de 1975. Das que se esmeram na toalha de mesa na noite de natal. Das que têm umas festas só lá de casa, tão lá de casa que no ano novo é tradição haver um divino arroz de miúdos de cabrito. Das que não deixam nunca morrer as tradições.

Ainda sou daquelas que chegam e sentam-se à mesa, só. Mas aos quase 45 começo a sentir que morro se um dia isto tudo se perder. A minha mãe e a minha sogra não são eternas, e em linha contrária a minha filha cresce. Cabe-me a mim, num dia próximo, tomar as rédeas. Porque inevitavelmente vou ser eu a mãe natal das memórias da Maria. E se hoje o natal pode ser tão prático que se compra tudo feito, não sou capaz de ser tão moderna. A cozinha é o coração da casa, e o amor é o tempo que gastamos a preparar tudo para os nossos. Os vapores dos cozinhados a engrandecerem a aura da casa, os cheiros, a musica de fundo, a escolha do melhor azeite e do melhor vinho do Porto, as luzinhas bem bregas a piscar, é nesses detalhes que se escondem as grandes memorias dos corações mais felizes e quentinhos.

É desta que começo a escrever as minhas Christmas recipes. Enquanto as verdadeiras autoras ainda cá estão para me ajudar. Vou por isto na minha agenda para fazer com a minha mãe nas próximas férias juntas.

Hoje acordei cheia de saudades da minha mãe

 


















e da minha ilha.

Para depois do Natal, assim lá para 2024

Fazer férias longe, na praia, de papo para o ar, a beber cocktails giros e bons. Pode ser com o dinheiro do euromilhões, mas já ficava feliz com um show me the money.

Mudar de casa, para uma mais gira, mais nova, mais bem localizada, mais segura, e minha. Aqui mexia-se no euromilhões também.

Ter cash de sobra para uma senhora a dias tomar conta desta casa. Pois claro.

Massagens ao domicilio, dia sim dia também.

Nunca mais cozinhar, e só comer coisas boas.

Oh pá, levar a becas à Disney!

Aos 45? Se fosse um euromilhões dos bons, nunca mais trabalhar! Cansada de aturar pessoas.

Ver um concerto intimista do Matisyahu, com o meu Luís. Nós os dois sozinhos, bem longe do mundo.

(...)

De maneiras que o comum mortal é feliz também enquanto sonha.

Isto de ser mãe

No meu caso é dureza. Mais ou menos uma bela crise existencial PERMANENTE. A minha filha é um doce, uma linda, um amor de menina. Faz asneiras normais: esta semana mordeu no pai e disse que está farta desta merda toda. Quase desmaiei. Hiperventilei para dentro e acabei a pensar nos meus erros com ela. Nas minhas falhas diárias. Na bula que os miúdos não trazem. Na minha falta de vocação para a coisa. Enfim, ando aqui entalada.

Não sou uma mãe fixe, daquelas que brincam, que fazem bolos com os miúdos, que não se importam nada com a desarrumação na casa. Também não sou uma mãe-policia. Mas sou, entre as duas coisas, uma mãe cansada. Que é mais ou menos aquilo que uma mãe não tem direito, não pode, não deve, ser estar ou ficar cansada. Sou por isso muitas vezes, uma mãe chata.

Se calhar um dia o puzzle ganha forma. Até lá vou crescendo com ela. E sim é verdade, muitas vezes crescer dói.

De maneiras que é isto

Se nos misturarmos muito com o bolor alheio, de alminhas mais escuras que o breu, acabamos por sentir o cheiro a mofo em nós. Não dá para preservar o lado zen da pessoa quando na verdade a vontade era de distribuir quatro pares de estalos à mesma criatura, mal ela abre a boca logo na primeira aparição após dez dias sem termos tido contacto. Não dá, santos que não se cruzam não devem frequentar a mesma praça. Vai daí que se calhar esta que está aqui começa a ponderar ir arejar para outros bailes.

E pensar que meio mundo traz terços pendurados ao pescoço. Deve ser mesmo para se protegerem daquele dizer dos mais velhos que diz que aqui se paga tudo, deve ser com o medo da resposta do universo sobre o mal gratuito que fazem aos outros.

Arre!, é tomarem sol na moleirinha e desaparecerem-me da vista!

Adoro

Adenda ao post anterior

É isto

Descobri estes dias, os três em casa e a chuva lá fora, que somos as pessoas mais felizes do mundo. Acima de tudo, sabemos que não é pouco estarmos vivos e estarmos juntos. Também sabemos que não vai ser sempre assim e talvez por isso o que temos agora é tanto para nós.

Na missa o senhor padre disse: É preciso sabermos que a Paz que buscamos não consiste apenas na inexistência de guerras. É com esta honestidade e frontalidade que queremos continuar a construir os nossos dias.

Formação profissional

Começa a ser regra, que antes de terminar o ano, para não fechar o livro em branco, faço pelo menos uma formação na Ordem. E fiz, durante estas férias forçadas em casa. 

Mas devo dizer que todas essas coisas que aspirei a nível profissional, já não são tão importantes. A minha vida conduziu-se de outra forma, se calhar porque me faltou sorte ou garra. Mas não importa tanto agora, porque a verdade é que sinto que estou no lugar onde tenho que estar. 

Feliz com os desafios que Deus me tem posto no caminho.

E hoje quando saí



Encontrei lá fora um Outono cheio de encanto.
Por mais que o mundo à nossa volta nos cause incerteza, a Natureza é sempre linear e perfeita. Basta observarmos o percurso de uma formiga, ou a forma mágica e sedutora como se despem e vestem as árvores.

Abertura oficial da época mágica

Nunca soube porque tinha duas árvores de Natal. Tinha por ter; quando comprei a segunda foi num acto irrefletido de insana atração irresistível. Digo em minha defesa que ambas são pequenas e discretas. Este ano é o primeiro ano de consciência plena da Maria, sobre o que é o Natal. Enquanto tirava as caixas com os enfeites dos arrumos, ela em alta voz fez de uma interrogação uma regra nova nesta casa:

Mãe, tive uma ideia! Vamos fazer a árvore de Natal no meu quarto?

E assim, uma década depois, a peça do puzzle encaixou: temos duas árvores de Natal porque uma é do quarto da Maria.

Férias forçadas

A miúda apanhou uma daquelas doenças do vasto rol dos contágios do leque quase interminável de doenças típicas de qualquer infantário que se preze. E porque a realidade é esta e não outra, quem mesmo é que tenta solucionar? Isso mesmo, a Shrec da mãe! Ou era a baixa ou eram as férias, calharam as férias. Vai daí que tivemos as duas uma semaninha de regabofe de naninhas agarradas uma à outra. Muitos mimos - o pai sempre a trabalhar mas mimou-nos tanto às duas que até eu me senti com privilégios de doentinha - muitas brincadeiras, desenhos, musicas novas, ver vezes sem conta os nossos episódios preferidos da Bluey, contar e aprender a lenda de S. Martinho, e decorar a casa para o Natal. Aproveitamos e fizemos tudo, para o restinho que falta de ano ficar mais levezinho.

E sem querer, descansei a sério. Ás vezes basta isso para ganharmos horizonte, mas nos apaixonarmos de novo, para ganharmos fôlego e vontade. Para percebermos a imensa sorte que é nossa, todos os dias.

Para os contentes

O Miguel chamou-lhe Um dia negro e acho que não há mais a dizer:

"No jornalismo aprende-se a redigir as notícias começando-se por resumir o essencial numa frase de abertura, a que se chama lead. No caso de notícias pouco importantes ou relativamente a situações ou países pouco importantes, o lead é curto e directo ao assunto. Na imprensa internacional de referência, o que aconteceu quarta-feira em Portugal resumiu-se a um simples lead: “O Governo português — um dos raros na Europa de maioria absoluta — caiu na sequência de o primeiro-ministro e algumas pessoas do seu círculo próximo terem sido alvo de abertura de processos-crime por suspeitas de corrupção nos projectos relativos à transição energética do país.”

E assim, curto e grosso, o país viu-se sumariamente enxovalhado e na lista negra de lugares onde seja saudável e prudente investir. De caminho, também e para efeitos internos, interrompeu-se a meio uma legislatura de maioria absoluta, atirou-se ao lixo um Orçamento prestes a ser votado e várias medidas urgentes e úteis para as pessoas dele constantes, interromperam-se as inadiáveis negociações com os médicos e a reestruturação do SNS, paralisou-se a execução do PRR e lançou-se em Bruxelas a suspeita sobre a boa aplicação dos seus dinheiros, aplicou-se um golpe de consequências ainda imprevisíveis na política de transição energética essencial a um país sem petróleo, gás ou centrais nucleares, mais uma vez protelou-se a escolha sobre o novo aeroporto de Lisboa, deixou-se a gestão governamental suspensa num momento em que paira uma recessão no horizonte, soltou-se, ufano, o populismo e a descrença nas instituições no ano das celebrações do 25 de Abril e devolveu-se a praça a alternativas forçadas que não existiam por si há três dias."

Miguel Sousa Tavares, in Expresso, 10 Novembro 2023

3 aninhos e esta compreensão

Vimos há dias na televisão a imagem de um menino, de uns 7 ou 8 anos, a chorar e a gritar desesperado, enquanto falava de vingança e contava que tinha ajudado a transportar um corpo decapitado. 

Sem queremos a Maria assistiu, e mesmo não lendo as legendas, naquele instante ela ficou tal como eu, perplexa a olhar para o desespero daquele menino palestino. E depois seguiram-se algumas perguntas.

Depois de irmos fazer outras coisas, encontrei a Maria de joelhos a por qualquer coisa debaixo da porta de entrada da casa: "É uma carta mamã! Escrevi uma carta àquele menino, para ele não ficar triste, que ninguém vai matar a ele e aos papás dele."

E era esta a carta: um desenho. Onde as mãos, o olhar e a boca, mostram que ela viu o mesmo menino triste e desesperado que eu vi. E que ficou preocupada com ele.

"Mãe porquê que os homens fazem a guerra?" 

Ainda não são preocupações para a tua idade filha, nem eu queria que fossem nunca preocupações para ti ou para qualquer outra menina ou menino no mundo, em idade nenhuma.

(...)

Preciso de descobrir novos sonhos

para substituir aqueles que me foram morrendo no caminho. Porque acredito que é o que alimenta o ser humano, a ilusão dos sonhos. É uma espécie de chama acesa.

Do baú


Esta é a minha única certeza e força de todos os dias. Tu Maria, e tu Luís.
(...)

Novembro

O meu mês. O meu virar de página, de ano. O meu ano novo. 

Importa dizer que quero mudar. Por dentro e por fora. Contrariando a tendência e os gurus, quero ficar mais calma por dentro e mais bonita por fora. Como quase tudo implica tempo e ou dinheiro, não são mudanças fáceis nem imediatas. Mas quero mudar e importa saber com certeza que quero mudar.

Fundamental: continuo um processo de não carregar com o alheio. Ultimamente tem sido difícil porque estou num ponto do caminho em que me sinto a abandonar pessoas, porque não consigo dar-lhes nada meu agora, nem um sorriso; porque acho que se lhes der esse sorriso me desintegro. Estou à beira de uma crise profunda de certezas, mais ou menos num barco meio à deriva e não, não consigo empreender esforços em mais nada que não seja ficar presa ao leme. 

Novembro é um bom mês para cuidar de mim.

Natal à porta

Não tenho vontade nenhuma de Natal, mas tenho muita vontade de ter vontade de Natal. Acho que está tudo tão cinzento à nossa volta, que é preciso contrariar. Espalhar luzes, risos, amor.

(...)

Do baú


Gosto tanto de ouvir esta musica em dias de chuva.
(...)

Blossom

 


Dá para acreditar que esta begónia tenha a minha idade? Tem. A florir hoje com esta intensidade e beleza. 

Plantas sobreviverão às guerras, e aos Homens.

(...)

A terapia de cada um








A minha é ter um bocado de tempo; pode ser uma boa mão cheia dele. Caminhar a pé pela cidade, apaixonar-me perdidamente por ela em cada percurso repetido. Ficar refém das imagens, das surpresas em cada canto. Tomar um breakfast sozinha, naquele sitio giro cheio de fotografias de um Porto velho, e de candelabros antigos, no meio de japoneses e brasileiros, com sincero pesar por quase não encontrar portugueses. Tomar um café da manhã a ouvir fado, com alguém ao lado a entregar-se por inteiro a um vinho do Porto e um pastel de nata. Sim, de manhã cedo; e porque não? Perceber a paz das pombas, a alegria dos tons quentes da folhagem nas árvores. Cruzar com miúdas adolescentes sem guarda-chuva a tocar às campainhas e fugir. Pensei que já ninguém fazia isso, já ninguém brincava a ser feliz com palermices pequeninas. E elas corriam depois, e riam alto pela rua fora.

Com o mundo tão cinzento, é mesmo preciso sairmos e respirarmos a plenos pulmões. Deixarmo-nos inundar pela vida pulsante lá fora, para não estagnarmos por dentro.

(...)

Debaixo de chuva

De uma chuva certinha, daquelas sem dó nem piedade. A chegar ao colégio da Maria, cruzei com o pai do Artur. O Artur vinha ás cavalitas do pai, que trazia um guarda-chuva gigante elevado a um metro acima da cabeça; portanto o Artur às cavalitas vinha bem protegido. Aquele pai só ia a fazer a maior acrobacia digna de um verdadeiro show. E o Artur era só o menino mais feliz do mundo a chegar á escola. Uma imagem cheia de Sol.

O poder transcendente do Amor incondicional dos pais é a coisa mais incrível e bonita.

A quem eu daria um abraço muito apertado hoje

Ao nosso querido António Guterres.

(...)

Dias de um mau sabor de alma. Deve ser por saber que a guerra lá fora continua feita de uma hipocrisia que já contaminou este mundo faz tempo. Que tantas crianças inocentes como a minha, estão encurraladas, sem saída. Deve ser pelo medo do pensamento mesquinho de que um dia chega a nós. Pelo pavor de perceber que a vida de tantos há-de sempre depender da decisão de tão poucos. Um mau sabor de alma também pelas coisas mais pequeninas. Pode ser por esta vida sempre tão incerta, por aprendermos à força a viver remediados: um dia de cada vez. Porque ficamos sem carro esta semana. Porque apanhei a primeira molha da new season. Porque nada de férias à vista e só me apetece hibernar como os ursos. 

E fico-me pela salvação que me chega do prazer renovado de quatro tragos de um bom vinho tinto. Pelo ronronar da minha filha e do pai dela num sono profundo a meio da noite, enquanto eu estou de olhos abertos no escuro. Fico-me pelo simples aconchego dos pés quentinhos; pela magia daquela hora boa do fim do dia em que chegamos a casa e estamos finalmente os três juntos. Fico-me pela alegria incontável de partilharmos uma maçã pequenina depois do jantar.

(...)

Minha pequena Maria

Tenho tantas coisas para escrever sobre ti filha. E na correria dos dias, não o faço. Mas é importante encontrar este tempo e este lugar, onde eu posso expressar as minhas duvidas, dificuldades, acertos, ideias. Ser mãe não é fácil, mas criar um filho é que é o verdadeiro desafio.  É através de ti Maria, que percebo o que poderia ter sido melhor na minha infância, foi depois de ti que deixei de idolatrar a minha mãe e consegui sem remorsos nem mágoas assumir com carácter definitivo e sem retorno a ausência do meu pai. Não vim a este mundo para julgar ninguém, não vim para fazer mal a ninguém. Mas ainda hoje após uma hora inteira (na vida de uma pessoa que não tem tempo para as coisas mais importantes) a ouvir a minha mãe lamentar-se de uma vida que ela viveu e escolheu, sem por nenhum momento interromper a conversa para me ouvir ou pelo menos perguntar se eu, nós, estávamos bem; percebi que é apenas isso mesmo: a vida dos outros. O mundo interior de cada um. Aspectos que aprendo a controlar e a deixar fora da minha aura que a cada dia se torna mais impermeável a algumas pessoas e circunstâncias. Mantenho o amor e mantenho a preocupação, mantenho sobretudo a gratidão; mas não carrego mais pesos que não são meus. E o que acontece é que muitas vezes já nem partilho as pequenas alegrias do meu dia a dia: ficam só nossas. Eu tu e o papá na nossa bolha de Amor. Porque a vida tem-me demonstrado que não posso ser imensa nem repartir-me por vinte realidades próximas. A minha realidade é esta, a nossa casa, a tua educação.

E sobre a tua educação, tenho que te pedir desculpa. Porque digo a toda a gente que és uma rebelde e que nem sei a quem sais. Não vou fazer mais isso. Porque não é verdade, porque tu ouves e assumes que é isso que a tua mãe vê em ti. Tu és uma menina com muita atenção e mimo, penso que estás a crescer com excesso e isso preocupa-me. Fazes birras, atiras coisas ao chão, ás vezes dizes ao pai como se eu não estivesse a ouvir "A mãe é maluca." Mas és uma menina cheia de personalidade. Não dás beijos a toda a gente, não és carinhosa a tempo inteiro. Mas és muito atenta e especial nos detalhes. Abraças-nos do nada, fundo, apertado. Dizes que nos amas quando te apetece, mas dizes com as palavras cheias e o olhar a brilhar. Suspeito que deves ser a criança mais feliz do mundo, de sempre. Queres lá saber dos brinquedos, o que tu queres mesmo é que nós brinquemos contigo, até pode ser com uma bola feita de um papel amachucado. Com apenas três anos, na noite passada rezaste assim: "Jesus primeiro quero que cuides de ti está bem? Depois cuidas de mim e da mamã e do papá." Com apenas três anos dizes-me que queres crescer depressa porque queres ir para a escola sozinha. E ficas feliz com dias de chuva torrencial, porque abrir o teu guarda chuva da Minnie é a coisa mais fantástica desta vida para ti. Aos três anos já sabemos que queres uma mota (não, não e não) e um jipe. Perguntas-me algumas vezes porquê que os meninos no recreio te dizem que não podes jogar à bola com eles. És tão parecida com o teu pai que ainda hoje dou comigo a pensar que és tu a chave deste milagre que tem sido a nossa história de Amor. 

Gostava que gritasses cada vez menos, mas que não percas a voz. Gostava de encontrar uma forma saudável de te levar a ter vontade própria em comer menos gelados e passares menos horas com o ipad. É tão difícil levar-te a contrária, e eu percebo que em algum ponto do caminho já sou eu e o pai a falharmos. 

Mas quero que saibas que vamos ser sempre os teus melhores amigos. Tu nunca serás sozinha nem terás que carregar com mundos alheios que não escolheste. Vamos amar-te sempre, para além da vida e da morte. Porque para nós, todos os dias estás acabada de chegar às nossas vidas; és tu a nossa pessoa preferida no mundo inteiro.

(...)


enquanto os sinos dançam, chora a catedral

Um comboio de tempestades

É o que chamam hoje ao Inverno rigoroso, ou se quiserem a um Outono tardio mas potente, num país onde muito facilmente Outono e Inverno se misturam e se confundem.

As estações estão mais agrestes, e nós continuamos a não nos preparar para o que vem.

De resto bem vinda querida chuva, querido Outono, querido Inverno à espreita.

Exercicio mental

A vida não nos deve nada, não mesmo. Não a nós que temos a sorte de viver neste cantinho do mundo onde ainda há alguma paz. Dou a volta às contrariedades dos meus dias e não é fácil mas foco-me nos meus amores: em amá-los mais e melhor. 

Estranhamente tem sido muito mais fácil assim.

A vida é um acto de persistência

Das coisas mais bonitas: a minha sobrinha trabalha hoje, no lugar onde nasceu.

(...)

Sobre as guerras, sobre mais uma guerra

É cada vez mais dificil acreditar, ter esperança. O mundo está cheio de ódio. Não compreendo nem quero compreender nenhuma razão para tantas mortes.

Promessas a mim mesma

Nunca mais me queixar de nada. A ninguém.

Não tratar a Maria como uma adulta, não exigir dela que aos três anos seja crescida. Não escurecer o caminho da minha filha porque não é esse o papel de uma mãe.

Nunca mais elevar o tom de voz.

Ficar quieta. Deixar vir a tempestade.

Acreditar em mim. Ser eu o meu colo.

Fim de semana juntos



Sea Life

Aprendemos que o polvo tem três corações. Mostramos à pequenina o que existe no fundo do mar que ela ama tanto. Tivemos tempo para nós, para as birras insuportáveis da nossa Maria (esperança de que sejam só os famosos terríveis três). Tivemos tempo para partilhar. Para por alguma ordem nos básicos para a semana que amanhã começa. Consegui ler um livro novo à minha filha, e conversar com ela sobre a importância e beleza das quatro estações. O pai cozinhou para nós. Dormimos, tomamos banhos demorados.
Descobri que estou desesperada por férias.

Acho mesmo que o que faz falta às famílias é tempo e liquidez financeira. Não é que isso resolva tudo. Mas faz toda a diferença.

Finalmente a chuva

Tão bom. Dias a ficarem de mansinho cinzentos. Como deve ser.

(...)

Flash

 





O amor é o invisível no habitual.
Agustina Bessa-Luís

A torre

Outra vez neste ponto do caminho.

Às vezes acho que sou eu. A que me atropelo, na pressa de fazer o que me parece o certo. Sou eu quem não para nos patamares para respirar e enxergar melhor o resto do caminho. Sou quem quem soma mais compromissos a todos aqueles que já não consigo cumprir.

Não tenho tempo. Para mim, para um banho demorado, para uma manhã inteira a dormir, para uma caminhada pelo parque sozinha. Não me lembro mais dos aniversários, não encontro tempo para visitar aquela amiga numa cama de hospital. Vou pelas ruas e só desejo não encontrar conhecidos.

(...)

Para a minha filha


O meu Amor maior.

Agarra-te à Vida

 

beleza na beira dos caminhos de ruas sujas e poluídas

e quem foi que morou ali?

enormes fatias de um céu vibrante, desde a janela da nossa cozinha

Always choose the bright side of life

E como não somos pais perfeitos

A Maria assistiu à nossa primeira briga. 

A reação dela foi de maturidade, de inteligência. A demonstrar muita doçura no amor que sente pelos dois. Ela é pequenina demais para se preocupar com gente crescida. E nós somos crescidos demais para levar raspanetes com razão, de uma menina de apenas três aninhos de vida.

(...)

Saúde mental

 


Bem pior que o estigma, é certamente o abandono.
Vivemos num mundo em que toda a gente só quer comer maçãs brilhantes.
(...)

Reunião de pais

No fim ganhamos uma dinâmica. Um jogo feito no silêncio, no qual uma caixa pintada passava pelas mãos de cada pai e ao abrir, cada um deveria reflectir em silêncio sobre o que estava dentro. A Educadora começou por fazer uma introdução dizendo que dentro daquela caixa estava algo muito importante para cada um dos nossos filhos.

A roda era grande, não sei como e acho muito bem mas ainda há casais que conseguem ir juntos a estas reuniões. Fiquei curiosa. Observava os pais por onde a caixa ia passando, e se uns abriam a caixa e ficavam parados a olhar e ás vezes até sorriam, outros fechavam imediatamente a caixa numa atitude quase de susto.

Quando chegou a minha vez, era um espelho que estava dentro da caixa. Quando abríamos a caixa, nada mais víamos que a nossa própria imagem. 

Tanta coisa para dizer sobre esta dinâmica. Um olhar mais profundo sobre a importância que temos na vida dos nossos filhos. Sobre quem realmente somos. Sobre a imagem que lhes damos, sobre a responsabilidade de os criarmos à nossa semelhança. Sobre a verdade: se estamos a fazer bem as coisas ou não, se estamos a fazer o melhor que podemos, se estamos felizes com o que estamos a fazer. Sobre sermos a árvore e sermos o jardineiro; e eles as sementes que lançamos, que precisam de ser cuidadas dia após dia, num enorme exercício de amor e resiliência.

Arrancou o ano lectivo e eu desejo que cada dia seja uma oportunidade de crescimento para todos. Para ela, e para nós pais também.

Minha querida filha

Minha pequenina. Este fim de semana o Outono brindou-nos com dias de Verão. Dias que os velhos dizem sempre que vamos pagar muito caro. Mas isso é depois. Agora a gente corre para a praia e faz de conta que o tempo parou num looping fantástico à volta daqueles dias mais felizes do ano. Tu e o pai, quem mais. Juntos na praia, a viver o teu mood permanente férias grandes. Porque tens o condão de viver feliz por tudo e por nada. Andas de metro e dizes: parece que estou de férias mamã. Entras no centro comercial e dizes: parece que estou de férias mamã. Comes um gelado e repetes a ladainha.

Obrigada amorinha. Por seres tão simples e tão facilmente feliz, por me ensinares que é a própria vida em si, inteira, toda ela uma bela fatia de férias grandes.

Significados


Continuo atormentada. Mesmo sabendo que apesar das minhas falhas, Deus não me falha. Tenho tido alguns pesadelos feios, acordo às vezes empapada em suor. Nunca falo das minhas angustias maiores como sendo tão grandes como a sombra de um lobo durante a noite. Porque acho - tenho a certeza - que os outros têm mais com que se preocupar. Dou comigo a pensar que este medo de perder tudo é só a herança de um pai que nunca me quis.

Perder tudo: oportunidade de fazer de novo, de fazer melhor.

(...)

Segredo

Concorri a um concurso de fotografia sobre Saúde Mental.

Sabemos que o Natal se aproxima

Quando a televisão nos anuncia os primeiros bombons da Ferrero. Hoje nem queria acreditar. Já?

Filhos

um Maria de Sousa

Crianças pequenas não são sempre adoráveis. A Maria faz coisas incríveis e enche-nos de orgulho tantas vezes, mas uma grande parte do tempo dela é dedicada a fazer coisas banais com birras à mistura. Nada de génios cá em casa. Acima da centena de avisos e ameaças, farta-se de deixar a porta do frigorifico aberta atrás dos iogurtes com a família do Bluey desenhada. Fica irritada sempre que a contrariamos e atira coisas ao chão (morro de vergonha mas é verdade), especialmente nos controlos anti-ipad. Ainda esta semana usou uma barrinha kinder para fazer um treatment completo à pele, roupa, carro e tudo ao redor: percebi o que estava a fazer pouco antes de entrar no trabalho e quase tive um enfarte. Do nada, lembrou-se de cantar alto no autocarro que todos são uns gordos; juro que não sei onde foi buscar aquilo, só sei que não a consegui calar naqueles berros à capela de acordar um morto.

E é muito difícil esta tarefa de educar. Porque hoje em dia nós pais muitas vezes lutamos sozinhos contra o mundo, e aqui não há tolerância, não vale deixar-se ir com a maré. Porque os miúdos são espertos, testam-nos constantemente e de alguma forma especial também nos educam a nós pais.

O certo é que as pequeninas coisas que ela faz com três anos, nos enchem o coração e nos fazem acreditar que este ser humano pequenino já quase do meu tamanho, está a ser pensado para fazer o bem e o belo. É só nisso que apostamos todas as nossas fichas, em estar atentos. Perceber, valorizar e alimentar sempre o melhor lado dela. Sem garantias nenhumas de futuro. Porque um filho é e será sempre uma carta fechada (escrita à mão).

Auto-regeneração

Acho que todos precisamos muito destes dias lindos deste Outono generoso. Todos precisamos de alguma alegria, de algum amor. De sorrisos de estranhos. De sorrisos ao espelho porque gostamos de nos ver. Todos precisamos desse lado belo da vida.

Ás vezes ficamos sem força, sem ânimo. Mas temos que alimentar o girassol da nossa alma e inclinarmo-nos sempre que possível, para esse lado-Sol da vida. Pode ser um mergulho numa piscina de água aquecida, ou no mar. Pode ser umas unhas bem arranjadas ou uma massagem bem feita. Pode ser o cheiro daquele perfume que nos comunica com os sentidos. Pode ser a canção da chuva ou uma manhã de compras. Pode ser beber um bom vinho ou rir alto com uma amiga.

Ser feliz é obrigatório. Vivemos em contagem decrescente.

Remar contra a maré

Em jeito de protestos contra o apertar do cinto, comprei os primeiros dois presentes de Natal. Um livro para a Maria e outro para uma amiga.

Heranças


Que não nos podem roubar, vender ou trespassar à Patagónia. 
Esta musica fala do povo português e de mais nenhum outro. Triste, mas absolutamente linda.

A minha casa no mundo


a sorte grande de morar no coração do Porto

A cidade está cada vez mais clean. Cada vez menos sombria, mais cosmopolita, menos nossa. Gosto da cara lavada que agora tem, mas não gosto do meio termo que não tiveram interesse em não ultrapassar. Portugal é pequenino demais para uma mudança tão drástica em tão pouco tempo. E os portugueses, os portuenses neste caso, deixaram-se arrastar com a corrente forte demais. Nem as gentes do norte que são conhecidas pela sua bravura, conseguiram enfrentar este saque às nossas vidas. Vidas de quem cá vive desde sempre, de quem tem um trabalho para pagar um tecto e pouco mais. Somos cada vez mais o povo que vai de muletas, o povo dos subsídios e das ajudas. Quando projectaram a cidade para este futuro brilhante, esqueceram-se que o ADN das suas gentes, sempre foi uma das coisas mais bonitas e características da cidade. Estamos a ser enxotados. Todos os dias, de quase todos os lugares. Não temos acesso aos lugares mais bonitos, não temos carteiras para cá morar e desfrutar de alguma cultura mais selecionada. Acho que quem sair agora, não vai conseguir voltar mais. Porque esta cidade já não é nossa, e somos cada vez mais obrigados ao silêncio sob o risco de os nossos protestos serem mal interpretados por quem está ao nosso lado. Os estrangeiros dormem à porta da loja do cidadão e é um retrato que me apavora.
Está tudo errado. A única coisa certa é a beleza incomparável do Porto, que sempre foi bonito mesmo quando era anónimo. O Porto das manhãs de nevoeiro, das varinas em becos e vielas, do casario velho e triste da canção do Rui. O mesmo milhafre de asa ferida é o que agora empreende voos inalcançáveis para muitos. O Porto dos jardins e parques que sempre teve mas que agora ganham prémios que os distinguem a nível mundial.

(...)

Farei tudo o que estiver ao meu alcance para que a minha filha continue a viver aqui. É uma aposta emocional, sei que ela um dia vai amar tanto esta cidade como eu, quero pelo menos garantir-lhe essa oportunidade. É importante para mim que ela cresça num lugar bonito, com história e cultura, cheio de verde, com mar e rio. Mesmo que essa cidade comece a ser cara demais, e eu fique uma mãe mais pobre um bocadinho demais. 

(...)

Porque não sei se conseguirei guardar para ela os entardeceres mágicos vistos da janela da nossa cozinha. Mas há mais janelas na cidade, e alguma há-de ser para nós se esse dia difícil estiver destinado.

(...)

Talvez um dia lá mais à frente tudo isto seja para melhor. Se calhar são só as dores do parir de uma cidade nova. Deus sabe.

O mundo em rota de colisão

Coitadinho do pai

Há assuntos que me revoltam, mais ainda quando o mundo entra numa acefalia em modo frenético de proteção dos mais coitadinhos, não dos mais indefesos.

Óbvio que vivemos tempos estranhos, que as nossas vidas são um atravessar da selva todos os dias, que os empregos nos consomem a inteligência e que basta sermos humanos para as falhas acontecerem. Mas porra, morreu uma criança. Que provavelmente chorou sozinha durante horas até desidratar, até não aguentar mais, até morrer. E não há crime, dizem estes profissionais todos.

Piurça da alma

Pior que ursa mesmo. Dias em que parece que o mundo me está a cair em cima. É a cabeça a mil com o futuro e nem sei se estarei cá para vivê-lo. É a rotina que me atropela: quando me deito às 2h da manhã e levanto às 7h para levar a miúda, entro em rota de colisão. São os autocarros à pinha e eu sempre a pensar no tempo de vida que gasto fechada naqueles locais às vezes inqualificáveis (hoje fui obrigada a circular colada a um casal de indianos que cheirava a bolas de naftalina). É a cidade com mais carros do que pessoas e nós os dois sempre a discutirmos de manhã porque o trânsito nos enlouquece e é só uma boa desculpa para a nossa incompetência que nos leva a ainda não ter decidido que a rotina deve começar às 6h. É o barulho de obras há meses a entrar-nos pela porta de casa adentro. É o prédio sempre sujo e todos os dias caras novas, gente que não diz bom dia nem espera por quem vem a correr, gente que circula no elevador com sacos do lixo com cheiro nauseabundo. É a falta de tempo para algumas pessoas realmente importantes para nós. A falta de férias também, que este ano não tivemos nem vamos ter. De resto ninguém está doente graças a Deus, só eu tenho esta garganta mais inflamada que o inferno. E só eu mesmo acho que não é preciso termos covid para usar máscara. Gripes comuns também se transmitem e é uma pena que a pandemia não nos tenha deixado sequer a consciência de que deveríamos sempre proteger-nos uns aos outros. Bichinhos de memória curta, é o que somos.

Suspiro fundo quatro vezes. Digo duas palavras bem feias que me vão pesar na consciência durante horas. Arrasto-me.

E ainda nem sequer começaram as chuvas!

Sobre um dia bem passado

 









Serralves. Num belíssimo dia de sol num Outono que começou generoso. Basta estarmos os três juntos, para estarmos bem e felizes. Mas há lugares que acrescentam.