Minha pequena Maria

Tenho tantas coisas para escrever sobre ti filha. E na correria dos dias, não o faço. Mas é importante encontrar este tempo e este lugar, onde eu posso expressar as minhas duvidas, dificuldades, acertos, ideias. Ser mãe não é fácil, mas criar um filho é que é o verdadeiro desafio.  É através de ti Maria, que percebo o que poderia ter sido melhor na minha infância, foi depois de ti que deixei de idolatrar a minha mãe e consegui sem remorsos nem mágoas assumir com carácter definitivo e sem retorno a ausência do meu pai. Não vim a este mundo para julgar ninguém, não vim para fazer mal a ninguém. Mas ainda hoje após uma hora inteira (na vida de uma pessoa que não tem tempo para as coisas mais importantes) a ouvir a minha mãe lamentar-se de uma vida que ela viveu e escolheu, sem por nenhum momento interromper a conversa para me ouvir ou pelo menos perguntar se eu, nós, estávamos bem; percebi que é apenas isso mesmo: a vida dos outros. O mundo interior de cada um. Aspectos que aprendo a controlar e a deixar fora da minha aura que a cada dia se torna mais impermeável a algumas pessoas e circunstâncias. Mantenho o amor e mantenho a preocupação, mantenho sobretudo a gratidão; mas não carrego mais pesos que não são meus. E o que acontece é que muitas vezes já nem partilho as pequenas alegrias do meu dia a dia: ficam só nossas. Eu tu e o papá na nossa bolha de Amor. Porque a vida tem-me demonstrado que não posso ser imensa nem repartir-me por vinte realidades próximas. A minha realidade é esta, a nossa casa, a tua educação.

E sobre a tua educação, tenho que te pedir desculpa. Porque digo a toda a gente que és uma rebelde e que nem sei a quem sais. Não vou fazer mais isso. Porque não é verdade, porque tu ouves e assumes que é isso que a tua mãe vê em ti. Tu és uma menina com muita atenção e mimo, penso que estás a crescer com excesso e isso preocupa-me. Fazes birras, atiras coisas ao chão, ás vezes dizes ao pai como se eu não estivesse a ouvir "A mãe é maluca." Mas és uma menina cheia de personalidade. Não dás beijos a toda a gente, não és carinhosa a tempo inteiro. Mas és muito atenta e especial nos detalhes. Abraças-nos do nada, fundo, apertado. Dizes que nos amas quando te apetece, mas dizes com as palavras cheias e o olhar a brilhar. Suspeito que deves ser a criança mais feliz do mundo, de sempre. Queres lá saber dos brinquedos, o que tu queres mesmo é que nós brinquemos contigo, até pode ser com uma bola feita de um papel amachucado. Com apenas três anos, na noite passada rezaste assim: "Jesus primeiro quero que cuides de ti está bem? Depois cuidas de mim e da mamã e do papá." Com apenas três anos dizes-me que queres crescer depressa porque queres ir para a escola sozinha. E ficas feliz com dias de chuva torrencial, porque abrir o teu guarda chuva da Minnie é a coisa mais fantástica desta vida para ti. Aos três anos já sabemos que queres uma mota (não, não e não) e um jipe. Perguntas-me algumas vezes porquê que os meninos no recreio te dizem que não podes jogar à bola com eles. És tão parecida com o teu pai que ainda hoje dou comigo a pensar que és tu a chave deste milagre que tem sido a nossa história de Amor. 

Gostava que gritasses cada vez menos, mas que não percas a voz. Gostava de encontrar uma forma saudável de te levar a ter vontade própria em comer menos gelados e passares menos horas com o ipad. É tão difícil levar-te a contrária, e eu percebo que em algum ponto do caminho já sou eu e o pai a falharmos. 

Mas quero que saibas que vamos ser sempre os teus melhores amigos. Tu nunca serás sozinha nem terás que carregar com mundos alheios que não escolheste. Vamos amar-te sempre, para além da vida e da morte. Porque para nós, todos os dias estás acabada de chegar às nossas vidas; és tu a nossa pessoa preferida no mundo inteiro.

(...)

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