2020

Almejo um ano de Paz. De aprender as vantagens do silêncio. De vestir mais vezes de branco. De aprender a ser mãe. De ficar mais bonita. De trabalhar muito, sem desanimar. De equilíbrio. De valentia. De conquistas e vitórias. De ver as minhas pessoas bem. De ouvir mais histórias que salvam o mundo. De Amor, aconteça o que acontecer, sempre de Amor.
Quando a médica me confidenciou que chegou a pensar que eu não chegaria a esta fase da gravidez, e que já passei por tanto que agora já só tudo me pode correr bem, tive medo.
Medo pela Maria, pelo pai dela, por mim, pelas avós, pela minha médica que tem sido ao longo de todo este processo uma verdadeira amiga, medo por todas as pessoas sinceras que nos rodeiam e torcem tanto por nós.
Medo das surpresas, medo de não estar à altura dos desafios. Pavor de a perder, agora, depois de já conhecer aspectos da personalidade dela como mais ninguém conhece na vida, nem exame algum médico. Medo de ter que voltar ao mundo de mãos vazias. Medo do estado em que possa ficar depois do parto, ela vai precisar de mim.
(...)
Das sensações mais extraordinárias é que desde que estou grávida que me sinto especialmente protegida por ela, a minha filha. Isto nunca saberei explicar.

Dezembro a terminar

Como é que eu sei que algo cá dentro já deixou de ser uma gravidez sossegada e passou a estar em movimento para o grande dia? Sei. É uma coisa tão física, não tenho como explicar.
Ando cá sozinha com os meus botões, a lidar com os medos; de repente parece que me vieram todos visitar e nem me lembra o Natal e só me apetece chorar.
Hoje particularmente - acho que pelo acumular de noites mal dormidas - sinto-me cansada. Ando meio frágil, como as feridas mal curadas, que ao mínimo toque sangram de novo.

Quase Natal

Acho que é assim sempre que estou longe de ti, mãe. O meu Natal é um quase Natal. Talvez com a chegada da Maria eu consiga mudar isso, talvez.
De alguma forma tu serás sempre o meu Natal, a minha imagem perfeita desta quadra, de alguém que heroicamente monta a mesa para tantos, que tempera cabrito e prepara o forno às seis horas da manhã, que enfeita a árvore de Natal com mais de quinhentas bolas e desenrola uma por uma de um papel branco como quem passeia os dedos por contas de um rosário, que procura o melhor bacalhau e faz as melhores doçarias como se fosse receber o Rei lá em casa, que na hora de abrir os presentes te transformas em mais uma criança no meio dos teus netos. Acho que nunca te disse Obrigado por essa imagem tão bonita. Certamente será a base para os Natais que um dia irei preparar para a a nossa Maria.
(...)

Domingar à quarta-feira



Tão bom.
Gostava muito, mesmo, que todas as grávidas do mundo pudessem viver esta experiência com a mesma plenitude, com a mesma sorte, com a mesma rectaguarda, o mesmo Amor imenso que me tem tocado a mim.
É uma experiência tão grande, tão intensa, que às vezes paro para pensar em quem viveu isto sem ter nada, nenhum tido de apoio, nenhum pingo de amor, nenhuma expectativa sobre um futuro. Ou naquelas pessoas que perseguem este sonho sem o alcançar, nos seus dramas maiores e de como tudo é sempre tão difícil para alguns.
Nesses momentos esqueço-me dos móveis que não chegaram, da minha conta bancária inadequada a imprevistos maiores, das noites mal dormidas.
Ainda que eu não saiba nem possa prever o que me reserva o futuro, até aqui o percurso tem sido abençoado. Aconteça o que acontecer, não me quero esquecer destes dias tão felizes.
Ás vezes na vida basta pararmos e reflectirmos, que logo nos daremos conta do quão gratos devemos estar. Em silêncio, nem sequer pedir mais.
Só agradecer.
(...)

Pedidos ao Universo


Partilhado pela Sofia do às nove no meu blog, na sua Love letter #58

Que sejas uma menina boa, Maria.
Mais do que de pessoas inteligentes, o mundo precisa de pessoas boas.

Ultima aula de preparação para o parto

Foi hoje.
E foi tão grande a intensidade emocional, que não consegui conter as lágrimas.
Está na hora de me começar a despedir da minha barriguinha de grávida, da minha menina aqui dentro protegida de tudo e de todos. Estou ansiosa por olhar para ela mas certamente algum dia sentirei saudades deste tempo.
Partilhamos receios, tiramos duvidas e mais uma vez que excelente classe de enfermeiras tive a sorte de encontrar no caminho até hoje. São profissionais que sem duvida se diferenciam pelo trato humano, pela proximidade que criam connosco, pela disponibilidade e compreensão.
Nesta ultima aula percebi que estávamos apenas metade do grupo inicial, possivelmente alguns bebés já nasceram. Embora hoje tenhamos falado também no imprevisível e no facto de a equipa clínica não bastar para garantir que tudo vai correr bem, quando chegar o momento quero ir para o parto Feliz e na expectativa do melhor. Hoje pela primeira vez tive um pensamento que me partiu ao meio: se a Maria não viver, eu também não quero cá ficar. É um bocadinho forte, mas foi assim limpo e claro que me veio à mente. Nem consigo dizer mais nada sobre isto.

"Nunca tive a minha casa tão limpa e arrumada como agora."

Parece que afinal não é paranóia só minha, ouvi algumas grávidas dizerem esta frase, entre risos de compreensão mutua. E fiquei triste, porque o quarto continua sem chegar e agora já avançam para os dias antes do Natal e eu penso que por causa disso nem sequer vou ser eu a arrumar o quartinho da minha filha, e só me apetece chorar.
Sou eu sempre a querer controlar tudo, e é a Vida a rir de mim e a obrigar-me a relativizar a importância de tanta coisa.
(...)

Sobre as pedras, os fantasmas, as sombras

Ao contrário do poeta, não construí um castelo com as pedras do meu caminho. Decidi antes que não há lugar para elas, deixo-as amorfas, mortas, sem função nem memória. Disse a mim mesma que aconteça o que acontecer, eu não tropeço duas vezes na mesma pedra.
Eu não.
(...)

L.



You are the magician

Em breve, saberei

Ontem ouvi alguém dizer que sobre as dores do parto, são indescritíveis. Por serem muito mais do que uma questão física. Dizia ela que parimos algo desde as entranhas, desde a alma, e que portanto é impossível descrever a verdadeira intensidade dolorosa e emocional do momento.
Saber que é um momento também de dor e choque para o bebé, faz com que de alguma forma a preocupação com a minha própria dor seja relativizada para um segundo plano; e pode bem acontecer que este pensamento só seja válido até de facto sentir as dores atrozes. Não sei, todas as fases da gravidez têm sido até aqui, de constante aprendizagem. Sobre os meus limites, sobre as minhas fraquezas, sobre as minhas forças.
Diz a ciência que se os homens pudessem dar à luz, 99% morreria no parto apenas pela intensidade emocional, imaginem se lhe acrescemos a dor. Acredito bem que sim. Cá em casa às vezes discutimos questões como a episiotemia e o pai da Maria encara tudo com uma naturalidade tão grande que me faz sentir uma cagarolaszita. Mas depois falo-lhe à bruta numa tesourada nos testículos e ele até se encolhe. E eu rio, rio muito. Percebo que a natureza não fez isto para eles, fez para nós. A valentia de diante de terceiros soltar todas as nossas misérias cá para fora, xixis e cocós, de entre lágrimas e gritos e odores nauseabundos sermos absolutamente bichos nesse instante, provoca por si só a confirmação de uma descoberta que nem todos fazem na vida:
Somos sem duvida, muito mais fortes do que pensamos.
A magia mesmo, acontece logo a seguir ao momento tão traumático. Todas as mães contam o mesmo: quando olham para o seu bebé pela primeira vez, todas as dores passam imediatamente para um segundo plano, porque há uma alegria imensa que toma conta de nós inteiras.
Coisa mais bonita e transcendente.

Lugares que curam

 


Ontem, logo após uns exames médicos mesmo ali ao lado, dei um saltinho ao Palácio de Cristal. Fiz uma caminhada a sós com a minha Maria. Cantei para ela, aproveitamos o sol, enchemos-nos daquela paz tão boa que acontece entre o arvoredo, as camélias, os pássaros e o rio. Mostrei-lhe o jardim dos sentimentos, lugar onde eu e o pai namoramos muito há vinte anos atrás. E depois fiz uma coisa que não fazia há anos, sentei-me num banco de jardim a ver a gente passar.
Estávamos mesmo a precisar de um dia assim reconfortante.

Com 38 semanas de gravidez

Cavalheiros! Acreditem que as vossas senhoras têm, a esta altura, verdadeiras preocupações em mente. Só a hora do parto e se o bebé nasce saudável, já chegam para que a mente esteja totalmente concentrada em aspectos bem mais sérios do que relações sexuais satisfatórias.
Tudo é permitido e tudo é saudável quando em vista está o prazer a dois, a partilha. Mas acredito que são muito poucas as mulheres que em vésperas de dar à luz, sentem prazer e estão igualmente dispostas como em fases anteriores. Se nem para dormir encontramos posições confortáveis, quanto mais para acrobacias com uma barriga enorme pelo meio e com um bebé que já se mexe muito a sério. Acredito em muita vontade de satisfazer o companheiro, mas desconfio um pouco dessa conversa de que na eminência do parto, com todo o desconforto físico normal que já se sente, a libido esteja no auge.
Por mais que as relações sexuais sejam até aconselhadas numa fase final da gravidez, cada uma de nós é por esta altura um turbilhão emocional e físico muito particular.
Este post não é nenhum sermão - quem sou eu. Vem na sequência de uma situação triste a que assisti na semana passada, nas aulas de preparação para o parto, que não vou relatar aqui por respeito à privacidade alheia.
Por isso:
Homens não forcem, mulheres não se anulem se não vos apetece. Se acontecer que seja só plenamente bom para ambos; se não, não vale.

Out of Africa

O meu filme preferido, a minha banda sonora de eleição.
Há uma passagem em que a baronesa Karen tenta conter a água das chuvas com a construção de um dique. No entanto a força da água é tal, que contra todos os esforços da equipa, a água rebenta o dique e corre selvagem pela terra fora. E a baronesa, cansada e vencida, diz:
- Let it go. This water lives in Mombasa anyway.
Cá em casa continuamos à espera dos móveis. Há mais duas ou três coisas que também ainda não estão resolvidas. Aquela ideia de fazer um chá com as amigas para lhes mostrar o quarto pronto, já está fora de questão. Com a arrumação feita ficará pronto já muito em cima do Natal, e eu confesso que me sinto cada vez menos disponível para qualquer tipo de compromisso.
Assim, os meus planos de estar tudo pronto a esta altura, não acontecem. E eu, tal como a baronesa Karen naquela passagem do filme tão forte para mim, baixo os braços vencida e penso Seja o que Deus quiser. E digo-o com serenidade, porque preciso mesmo de que a minha paz seja inabalável neste momento.
(...)
Dias envolta em misticismo, com a minha espiritualidade desperta, com todo o meu corpo e alma a trabalharem a chegada desta coisa nova tão forte que se chama instinto maternal.
Um bocadinho mais calma. Afinal a vida vai cumprir os tempos certos, não os meus tempos. E os medos e as angustias são pesos demasiado grandes para carregar a tempo inteiro.

Razões

A bebé que nasceu com 27 semanas num cabeleireiro, faleceu ontem. Crash boom bang! mais uma noticia triste. Ninguém consegue perceber o quanto estas coisas mexem comigo, o quanto fico a panicar por dentro, desconcentrada a fazer cada vez menos o que me tinha proposto. No pico desta emoção, aparece a péssima sensação de que entro em modo give up em relação a todas as coisas que ainda não estão prontas. Deixar tudo como está, e que se lixe. Não me cansar, simplesmente.
É um bom dia para começar a usar as minhas estratégias mais internas, preciso de rezar senão sufoco. E de chorar sozinha, com a minha vela branca acesa à Virgem Maria. Preciso de muito silêncio e de não me importar com nada nem ninguém. Está a chegar a minha hora, e do que eu tenho medo não é das dores do parto.
Queria o colo da minha mãe, só ela e as mãos dela em mim, me poderiam acalmar hoje.
(...)

Socorro



Há uns bons anos que escuto esta musica quando estou realmente aborrecida, chateada, contrariada. Costumava ser um bom exercício em dias em que o trabalho não corria bem. Acho que é a primeira vez que a escuto num contexto out of work. Mas sabe bem, ajuda a soltar o grito cá dentro; e a julgar pelo quanto a Maria se mexe ao ouvi-la, desconfio que também gosta OMG espero que não herde a mesma neura da mãe!.
Hoje apetece-me fugir, literalmente.

O descalabro

Aqui a tentar lidar com o caos instalado à minha volta, muita vontade de chorar e com algumas lágrimas a saltarem cá para fora sem que eu controle.
Está tão próximo. E eu penso muito em todas as possibilidades, angustio-me e sinto medo - esse palavrão que tanto detesto e que não combina nada comigo.
O telefone que não pára e eu a precisar tanto de tempo e descanso. Tudo o que faço é em câmara lenta e parece que não vejo nada finalmente feito. Ando irritada e um bocadinho insuportável.
Só os dias têm estado airosos de tal forma que posso abrir as janelas de par em par e arejar esta casa, como um sinal de que os anjos me hão-de ajudar a cumprir o que tenho estipulado.
Não é uma fase da minha vida em que eu espere compreensão. Afinal estou em estado de graça, tenho tudo para estar feliz, tenho sido mimada em excesso. Mas cá dentro, só eu sei como estou e só eu entendo as razões para este conflito interior.
Vem aí a minha bebé. Quero a casa preparada como deve ser para a chegada dela é pedir muito?, quero-me a mim calma e descansada para me concentrar só neste momento.
(...)


Goiabas

Douradas pelo Sol da minha terra; o maior presente.
O meu fruto preferido; o ambientador natural certo, espalhado pela casa.
Chegaram-me de Angola, cheias de uma tal generosidade, numa fase da minha gravidez em que me deliciam completamente.
No leque dos desejos mais marcantes, a juntar aos eclaires e às torradas com muita manteiga, já fazem parte da história da Maria.

Oração para todos os dias



Poderosa.

L.

Estamos no oitavo mês, a alimentar e fazer crescer com todo o cuidado a nossa sementinha-milagre. E sabes, às vezes ainda me belisco e fecho os olhos só para abri-los e ver que é verdade, que tudo isto nos está mesmo a acontecer. Que vivemos juntos uma Paz muito maior do que pensei alguma vez existir, que somos guerreiros armados um pelo outro, que sabemos rir juntos - da vida e de nós mesmos -, que nos encontramos um dia ainda no coração da juventude e que estamos a ter a imensa sorte de estarmos juntos de novo no cume da idade adulta já a conseguir perceber os primeiros sinais da idade que avança, que somos Amigos e queremos com toda a alma e coração ser pais. Continuo a olhar para ti todos os dias e a sentir um Amor imenso. A estar tão grata pela generosidade da Vida, com a certeza de que todo o Bem que fizermos daqui em diante, será sempre insuficiente para pagarmos o tanto que nos tem sido dado.
(...)
És tu meu amor a minha sorte grande, a minha Casa no mundo.

Dezembro



Desconfio que este vai mesmo passar a ser o mês mais bonito do meu ano.
Temos o Natal que é a festa da Família; em Dezembro nasceu o meu Amor e a minha mãe e tenho para mim que vai nascer também a Maria. É neste mês que costumo fazer o balanço do ano que termina, e me preparo - a casa e o coração - para estrear um novo ano.
Hoje é dia 2 e lá fora há um céu azul do mais generoso que vi, e um Sol vivo que logo de manhã fiz questão que me entrasse pela casa adentro para nos encher de Luz. Adoro estes dias assim, são os mais bonitos do ano e quando acontecem em Dezembro sabem mesmo a magia.
Na nossa árvore surgem as primeiras lembrancinhas - muito modestas - mas cheias do melhor amor que há nas nossas intenções. Nada de compras no Black Friday nem visitas aos centros comerciais, tenho optado pelas lojas de proximidade ou que me ficam no caminho quando tenho alguma consulta médica.
Os móveis ainda não chegaram e a casa está meio caótica. Espero ter tempo de deixar tudo em ordem antes do grande momento da minha Vida. Gostava de viver este mês com mais calma, de poder descansar ainda antes do grande dia, de tomar banhos demorados e dormir longas sestas, de fazer duas ou três pequenas caminhadas por onde haja muitas camélias, de organizar uma bonita banda sonora para mim e para a Maria, de cuidar fundamentalmente de mim porque estarei a cuidar dela, de começar a ler um livro novo para terminar só depois dela chegar, de rever com calma todas as coisas fantásticas que a minha filha já fez por mim - agradecer - e preparar-me para a nova pessoa que serei quando nascer com ela.
Vem aí a profissão mais exigente de todas, a maior e mais importante escola que hei-de frequentar.