Dias de um mau sabor de alma. Deve ser por saber que a guerra lá fora continua feita de uma hipocrisia que já contaminou este mundo faz tempo. Que tantas crianças inocentes como a minha, estão encurraladas, sem saída. Deve ser pelo medo do pensamento mesquinho de que um dia chega a nós. Pelo pavor de perceber que a vida de tantos há-de sempre depender da decisão de tão poucos. Um mau sabor de alma também pelas coisas mais pequeninas. Pode ser por esta vida sempre tão incerta, por aprendermos à força a viver remediados: um dia de cada vez. Porque ficamos sem carro esta semana. Porque apanhei a primeira molha da new season. Porque nada de férias à vista e só me apetece hibernar como os ursos. 

E fico-me pela salvação que me chega do prazer renovado de quatro tragos de um bom vinho tinto. Pelo ronronar da minha filha e do pai dela num sono profundo a meio da noite, enquanto eu estou de olhos abertos no escuro. Fico-me pelo simples aconchego dos pés quentinhos; pela magia daquela hora boa do fim do dia em que chegamos a casa e estamos finalmente os três juntos. Fico-me pela alegria incontável de partilharmos uma maçã pequenina depois do jantar.

(...)

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