Ontem fiz da ida ao supermercado, uma ida ao teatro. 
In loco, todos os personagens estavam devidamente equipados com máscaras, alguns com luvas; excepto alguns funcionários que não usavam nem máscara nem luvas. Uma espécie de altifalante ia lembrando que devemos guardar a distância mas olhando à volta, a voz do aviso era só um cromo repetido do qual já todos pareciam estar fartos e que portanto ao qual já ninguém fazia caso. Algumas vezes, numa atitude de completa fobia social fundamentada, senti-me a fugir de estranhos que irresponsavelmente se colavam a mim. 
Todo o cenário me altera bastante. Sábado após sábado, vinda do supermercado volto a casa com uma sensação enorme de despersonalização, de desencontro. Como se me tivessem metido numa cápsula filmática para viajar ao futuro, e na volta ao presente eu me encontrasse profundamente estranha e preocupada.
No percurso até casa, quase ninguém de máscara e ou luvas, quase ninguém a fazer desvio para cumprir a distância recomendada. Muito pólen no ar, gente vestida com roupas frescas, um primeiro agradável dia de Primavera que todos pareciam querer respirar. Mesmo assim, algo diferente nos semblantes. A suspeita da mesma incerteza partilhada por todos, por mais que uns finjam estarem alheios aos outros.
Começo a pensar no quão complexo vai ser retomar as nossas vidas lá fora, a nossa normalidade no trabalho, as rotinas tão fundamentais para tantos.
(...)

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