No meio de uma casa completamente de patas para o ar - Maria ao poder - tenho aprendido a deixar correr. Já percebi que nisto de ser mãe a tempo inteiro, a prioridade impõe-se naturalmente. Um dia arrumo a casa, com a certeza de que vai durar pouco tempo. É uma luta interior forte para mim, confesso. De resto reservo-me ao direito e ao prazer de ficar de pijama o dia todo, contra todas as indicações. Tenho dormido sestas, total novidade aos meus quarenta e dois anos de vida. E com as sestas, outros prazeres maiores, como ouvir poesia ou ler, simplesmente. Tenho sentido o lado doce da tristeza, e tenho-me permitido ir ao fundo da tristeza. Como ontem, ao ver um documentário sobre o dia a dia de um médico intensivista, em que me caíram as lágrimas e fui deitar-me assim, moída pela dor inteira de conseguirmos ser tão indiferentes a tanto sofrimento alheio e a tanto empenho por parte de seres humanos cheios de uma nobreza maior.
As formações que tenho andado a fazer têm sido difíceis de gerir com os timings da Maria, ao mesmo tempo têm ajudado a que o tempo não chegue, pelo que presumo que neste momento sejam mais do que importantes para manter alguma sanidade mental. Têm sido de tal modo educativas que tenho andado a pensar mais seriamente nestas coisas de termos mesmo que agir de forma consciente para salvar o Planeta. Há umas quatro coisas, para já, que quero tentar mudar no nosso dia a dia, tentar trazer para a nossa vida em 2021. É bom termos objetivos, fazermos planos. Saber quem somos, porquê que estamos aqui, para onde queremos ir.
De sobra dizer-vos que nem sei o que seria de mim, se tivesse que viver esta fase do mundo sem a alegria genuína e o conforto no coração, que me dão todos os dias a presença da minha filha e do pai dela. É verdade que estar em casa sem trabalhar, em alguns momentos me desorienta e muito. Mas os dois dão-me tanta força e inspiração, e é grande este sentimento de pertença familiar, é uma coisa que nos salva de praticamente tudo. Procuro tentar perceber o que a vida me permite agora, neste exacto momento. E são essas chances únicas que aos poucos - aos poucos - começo a aproveitar.
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