Para os dias em modo offline

RM

Deja de moverte y quedate quieto,
Y la tranquilidad te moverá.
Poema Zen
A lembrar o Cântico negro de José Régio, alguns portugueses começam a insurgir-se. É sempre bom que ao menos pensemos sobre as coisas:
https://raquelcardeiravarela.wordpress.com/2020/04/28/no-ic19-nao-ha-covid-19/

O nosso clima

Deve ser sem duvida a principal causa para a resposta vista como eficaz, de Portugal à pandemia. O zé fica em casa com gosto, agradece se tiver que ficar confinado às mantinhas do sofá.
Não há pachorra para este Abril águas mil.

Paradoxos

Imagem da web

Li no outro dia algo que me chocou bastante. Que são estes, os outrora capitães de Abril, a quem agora queremos roubar a liberdade.
(...)

Senhores governantes

Não são só os animais que estão a invadir as ruas das cidades. Em Espanha, crianças gritaram em modo selvagem ao avistarem outras crianças, depois de tantos dias fechadas em casa. Aglomerados de pessoas sem protecção e sem guardar distância, ávidas por comer peixe, na lota de Matosinhos, foram presságio do que vai acontecer nas praias logo que cheguem os primeiros dias de calor. Mais ou menos está tudo descontrolado.
Eu bem digo que o mais difícil mesmo não vai ser conseguirem uma vacina em tempo recorde, vai ser driblarem bem a bola do comportamento humano.
(...)

Coisas bonitas para um dia fazer com ela

Festival de cometas na ilha

Sobre este pequeno ser nas nossas vidas

A minha relação com a minha filha evoluiu tanto. Sem a minha mãe, sem a minha sogra, sem irmãs ou amigas por perto, para supervisionar este acontecimento. Tem sido feito só ao nosso ritmo e isso é tão bom. Perceber e descobrir que afinal conseguimos ser pais porque está em nós e não nos outros, com simplicidade e sem medos.
Com o pai é indescritível a constatação do Édipo: os meninos são da mãe, as meninas são do pai (com a excepção de que eu sempre fui da mãe). A Maria fala com o olhar cada vez que encontra o do pai, ficam ali os dois numa comunicação tal que eu passo imediatamente ao lugar de assistente. Mas isso também é tão bom, sentir que o Amor que os une vai ser para sempre a grande muralha da vida dela.
De resto houve um período claro de adaptação. A esta nova pessoa na nossa casa, no nosso quarto, nos nossos dias, na nossa vida. Nem sempre foi fácil mas estabilizadas as percepções do ritmo de uma menina que chora se tiver cocó na fralda e que berra como se o mundo fosse acabar quando sente fome, tem sido a nossa companheira de vida ideal. Mama o ultimo biberão à meia noite e dorme seguido até às sete da manhã. Já conseguimos jantar sossegados, já dorme a sesta com o pai no sofá enquanto ele vê filmes. Já lhe corto as unhas sem stress, adora tomar banho!
Em breve vai começar com as sopas e vai ser grande ver a cara dela ao descobrir novos sabores. O nosso primeiro passeio sozinhas, aqui pelo largo da igreja, logo que a Primavera se lembre de nos dizer que já chegou. Levá-la para uma manhã de praia. Quando nos metermos pela primeira vez num avião com ela. A inclusão no infantário; todas as mães dizem que se sofre horrores mas eu confesso que estou ansiosa por vê-la fazer aprendizagens fora do ninho. Mal posso esperar por tantas novas aventuras, com este pequeno ser que curiosamente se tem revelado forte por três.
Eu e o pai temos crescido muito com ela. No nosso Amor e nas nossas capacidades.

Entregues à bicharada

- Senhor Presidente, sobre o COVID19 poderia informar-nos sobre qual é a cifra de mortos neste momento no Brasil?
- E eu sou coveiro? Eu sou coveiro? Não sou coveiro não!

Custa a acreditar, mas aconteceu mesmo.


Um grupo de amigos reunidos, a cantarem a Liberdade.
Das coisas mais bonitas que o Saramago um dia fez.

Hoje é dia de precária

Damos a volta às palavras para atribuir algum humor ainda que mórbido, aos tempos actuais.
Hoje é o dia da semana que estipulei para a única escapadinha que me permito: sair para comprar frescos, verduras e pão.
Logo às sete da manhã vi pela janela que o dia está bem cinzento, daqueles em que só apetece cama ou sofá, daqueles portanto em que os portugueses se vão portar muito bem e cumprir responsavelmente a quarentena. Por vezes dou comigo a pensar que este vai ser também um tempo de muita hipocrisia, de tanta carneirice. Ouvi que os surfistas só vão poder entrar no mar à vez. Acho que quanto mais pisam fundo nos atropelos à nossa liberdade, mais vontade tenho de longos passeios à beira mar e pelo parque da cidade. Isto é tudo pelo bem de quê, pelo bem de quem? Valente pantufada estão a levar aqueles que realmente são fortes e que nos últimos anos construíram alguma coisa. Estão a obrigar-nos à sobrevivência das espécies, numa forma muito clean de nos quase seleccionarem. Parece-me tão triste.
Ainda bem que lutamos pela Liberdade um dia. Caso contrário eu não poderia hoje estar aqui neste blog casa de ninguém, a partilhar as minhas ideias livremente.
(...)

Gente assim

https://www.ritaferroalvim.com/2020/04/25/a-caravana-magazine-no-2-essencia/

You little Mary

Será quase uma ironia, mas acontece com frequência: quem mais sofre é quem menos se queixa.
Acontece também o desconserto do despropósito, naqueles que apesar das circunstâncias, continuam focados no próprio umbigo: não importa que tanta gente esteja a perder o emprego, o que importa é que eu mantenha o meu. É por isso que ás vezes não nos falta nada, mas acomete-nos uma tristeza funda; acontece comigo.

- Como se ha pasado la guerra Ambrosio?
- Pues no se ha pasado mal! - responde el interpelado.
Mi Luis murió en el 37 en el frente de Aragón, a mi Ambrosio le tuvieron que cortar una pierna en Guadalajara, a mi Felisa la dejó preñada un sargento y luego no quiso saber nada. Ahí la tengo con dos mellizos, uno de ellos cieguecito, el pobre, y yo me quede viudo el ano pasado, pero, aparte de eso, no se ha pasado mal.
Juan Eslava Galán, in Los años del miedo

(...)

Não é norma mas vejo algum fundamento nas ultimas observações do senhor Trump sobre o CV19 e a China. Se forem ficando atentos às noticias, já não é só o senhor Trump a considerar que se deve ir mais ao fundo da questão. Está a morrer demasiada gente para deixarmos a coisa no ar. A consequência por ignorarmos a importância de se apurar a verdade até às ultimas circunstancias, pode muito bem vir a ser que dentro de pouco tempo teremos novo vírus à porta, igual ou pior.
Não vai ficar tudo bem por encontrarmos um culpado. Não é necessário que haja um culpado. Mas é importante a verdade.
(...)
Viram a reportagem sobre a forma como Israel se organiza na luta contra o CV19? E achamos nós que somos muito evoluídos. Nos hospitais ninguém morre sem que seja dada a oportunidade a um familiar de se despedir; para isso é dado ao familiar um fato de protecção homem-da-lua, igualzinho ao dos médicos. Comove-me que se faça de manter a dignidade humana na hora da despedida, um principio inquestionável.
(...)
Numa altura em que o melhor de cada um deveria ser a grande aposta de todos, surgem algumas pérolas que nem merecem comentário. Pequenos comércios continuam a vender uma máscara a quatro euros. Produtores vão para os principais jornais mostrar como é uma desgraça terem que deitar carradas de leite fora; deve ser porque não sabem que existem tantas instituições a quem doar, tantas famílias numerosas que estão a passar por dificuldades para alimentar crianças. Alguns hospitais privados cobram valores escandalosos aos clientes pelo material de protecção que tem que usar o médico, e já há quem pague mais pelo dito material do que pela consulta.
(...)
No país vizinho, nas ruas de Barcelona anda uma criatura à solta a matar sem abrigo, descompensou precisamente agora. Só numa noite apareceram três mortos com uma pancada semelhante na cabeça. Já não é só o frio, a fome, a solidão ou o CV19 que os mata. Caso para lembrar o dizer do povo: eramos pocos y parió la abuela!
(...)
Por causa destas notas e de tantas outras, não é verdade que o Planeta enviou este vírus para nos abanar. É evidente que está a ter inegáveis consequências positivas que nos obrigam à reflexão, mas está aí o numero de mortes para nos lembrar que consequências dolorosas e negativas também. Há gente que espremida, só dá pus, sem CV19 e com CV19. Uns mentem, outros procuram o conflito, outros vêm a oportunidade, outros vitimizam-se, tantos adoecem mentalmente porque infelizmente nem todos temos a mesma capacidade e oportunidade para crescer nas adversidades.
Desculpa querido Planeta, pelo que andamos a pensar que serias capaz de nos fazer; somos filhos ingratos até esse ponto. Parece quase necessidade de termos que encontrar uma explicação mística para suportar a gravidade da tragédia. Eu também não gosto da toxicidade dos Homens, mas mesmo assim preferia que este vírus nunca tivesse saído da ficção cientifica, por mais golfinhos que se avistem felizes. E há tanta gente genuinamente boa, não seria justo por esses.
Disse tão bem o Ricardo Araújo Pereira, como se nós tivéssemos tal importância vistos do Universo...

O lado mau da quarentena

Dos dias em que se amontanha uma péssima sensação de má gestão do tempo, de um tempo muito útil que tão cedo posso não voltar a ter. Da inércia, da preguiça, da falta de compasso para criar, produzir ou ser alegre. De uma deflexão de mim mesma. Dos dias todos, aborrecidamente iguais. Da incerteza que atropela, do medo que ás vezes espreita. Por causa disso, da incapacidade de fazer planos. Da falta de paciência num tempo em que a paciência faz toda a diferença.
(...)

Bom dia Vida



Gosto mesmo desta musica, na voz desta menina de apenas quinze anos.
Transmite força, faz pensar que o Bem é um movimento implacável.

Portugal nas bocas do mundo

Dizem lá fora, que nos estamos a portar muito bem. Atribuem o êxito que consideram Portugal estar a ter na luta frente ao CV19, a um trio comportamental:
Antecipação. Disciplina. Solidariedade.
(...)

Do que não se explica

https://www.youtube.com/watch?v=T457UDaIeBU&feature=emb_err_watch_on_yt

Verdades para gente crescida

Num período pós-isolamento, há-de ser crucial que renasça o consumismo. Esse consumismo que nos torna fúteis, que nos faz gastar mais do que temos, esse que põe a máquina a girar. Precisamos todos juntos, de salvar a economia.
Ás vezes fico mesmo muito orgulhosa dessa tua forma de ser, simples e limpa. Dessa tua capacidade persistente em olhar o mundo através da lupa da paz. De veres o Bem, de seres do Bem, de estares de Bem com a vida. Brinco que és lento, mas és só pacato. Nessa tua balança de sentimentos só cabe o que equilibra, e eu fico emocionada porque sem guerras nem fogo de artificio, tantas vezes apresentas-me soluções válidas para salvar o mundo.
O Amor não é um acaso, é uma construção. Escolhemos as pessoas e somos escolhidos por elas. E é a partir daí que crescemos ou regredimos.

Do Feng Shui*

*Arte milenar chinesa que advoga ao lar a importância de um templo.

Gosto das casas com muita luz. Gosto muito da vida intrínseca à presença das plantas. Gosto de velas aromáticas. Gosto do dourado. E gosto de tapetes, de os mudar com frequência. Gosto de roupa branca e do convite das almofadas. Gosto de flores naturais, e de fruteiras cheias com laranjas e limões. Gosto da canção da água, e gosto mesmo muito de pedras.

Coisas boas da quarentena

Os assados de domingo no forno, estilo os da mãe e da avó, de toda uma vida, aqueles que nunca antes me imaginei a ser capaz de fazer.
Longas e prazerosas sestas com a Maria, daquelas de babarmos na almofada, de virarmos as duas dois pachorrões bebés felizes e tranquilos.
O sair uma vez a cada oito dias para uma ida ao supermercado, e no caminho sentir uma alegria genuína ao ver as árvores floridas e a sombra nos caminhos.
O aprender a gostar dos dias em que deixo para lá arrumações, regras e rigor; em que fico só na paz e na preguiça.
O voltar a ler, e a reler; com assiduidade e só porque apetece.
Os abraços apertados cá em casa. São tão bons, sempre foram.
(...)

Três meses de ti

Minha pequena Maria, minha dádiva, meu milagre, meu Sol.

"(...)siempre hay algo que escapa, y lo que escapa, lo que es indecible, lo que pertenece a la categoria de lo inefable, lo que no se puede expresar con palabras, es ahí donde está el amor."
José Saramago, in Conversaciones inéditas José y Pilar, de Miguel Gonçalves Mendes

Voltar aos dias assim





Em que sentimos falta das horas, dos dias e dos lugares mais calmos na cidade. Tendo por garantido o bulício da vida nas horas de enchente e pressa, porque é esse o verdadeiro ADN desta casa iluminada no mundo.

Gente assim

"(...)uno no puede jamás en su vida sentarse a contemplar el espectáculo del mundo como espectadores. Uno trabaja todos los dias para transformar las situaciones. Si estoy sola pues voy a buscar compania porque entre los seis mil millones de personas que tiene el mundo seguro que hay gente a la que le pueda dar algo. Lo que siempre podemos, es dar.(...)"
Pilar del Rio, in Conversasiones inéditas José y Pilar, de José Gonçalves Mendes
Com a quantidade de experts e iluminados de todas as áreas, que todos os dias aparecem nos media a dar palpites e vender soluções, esta crise fica a parecer só um capítulo-dramalhão de uma boa telenovela. Hoje em dia há dicas para tudo, desde saiba como manter uma relação à distância até aprenda a gerir as suas finanças em tempos de CV19. Gente que vende tudo, eles sabem tanto que a sabedoria já quase se vende como o sabão, em barras. Seria surreal que até em tempos de crise com as emoções à flor da pele, fôssemos ainda assim apenas rebanhos.
Não é uma boa atitude vivermos em permanente desconfiança para com o mundo, mas cada vez mais é pertinente fazermos uma selecção criteriosa dos conteúdos que realmente nos interessam no meio da quantidade de informação que nos tentam impingir. Não devemos deixar de usar as nossas cabeças, só porque outros cada vez mais tentam vender as deles, sob o risco de perdermos uma certa diversidade e particularidade intelectual que afinal nos distingue.
Sobre outros sabedores, os que ditam as regras que se calhar também alguém lhes ditou a eles, esta semana uma amiga comentou comigo que não conseguiu deixar de observar que enquanto o senhor Presidente da República falava ao povo, magotes de jornalistas atropelavam-se ali em pleno directo, uns em cima dos outros. Ainda sobre a distância social tão bem aconselhada por eles, flagrante ver a nossa querida Catarina Martins a confidenciar ao ouvido com o colega. Já nem exploro o comportamento do senhor António Costa no mercado do peixe em vésperas de Páscoa; apesar de tudo não nos podemos esquecer que eles também são seres humanos.
Não é assim tão grave. Pois não. Isto é só mais ou menos o mesmo que eu querer educar a Maria sem lhe dar o exemplo.
(...)

Perspectivas

Olhar o mundo assim


Da que em mim nunca se verga.

Marcas de nascença com história para contar

A Maria traz uma, a Mancha Mongólica. Uma nodoazinha bem roxa numa nádega, que tem que ver com uma produção anormal de melanina, que tende a desaparecer por volta dos três anos. Quando a vi nua a primeira vez, pensei que durante o parto a tivessem magoado. Foi-me explicado o que era e a origem do nome. Por ser muito comum em asiáticos associaram-na à zona da Mongólia. No entanto é comum também em descendentes de raça negra e em hispânicos, sendo rara na raça caucasiana.
Quer isso dizer que ali naquela pequena manchinha no teu corpo, guardas vestígios dos teus antepassados minha filha: eu tua mãe mulata, as tuas avó e bisavó mulatas, a tua trisavó negra. Uma trisavó que foi escrava, viveu um romance com um alemão, morreu aos 107 anos, com a dentição completa, também ela de nome Maria.
Infelizmente tenho muito poucas vivências, memórias e histórias para te contar sobre Angola. Mas é importante que saibas da existência das tuas remotas origens africanas, e que encontres beleza e valor nisso.

As aprendizagens

Compreensão.
Connosco, com os outros, com o mundo.

Resiliência.
As gerações postas à prova, superam e desenvolvem.

Respeito.
Pela própria vida, pelo bem comum.

Gratidão.
Por todas as pequenas coisas que nos fazem tão felizes.

Na sombra destes dias de angustia, temos todos uma excelente oportunidade para trabalhar e desenvolver estas quatro capacidades fundamentais ao desenvolvimento de um ser humano capaz e tolerante.

Sobre o confinamento

Ao fim de algumas semanas de isolamento e incertezas, já todos mudamos um bocadinho.
Cruzei com a vizinha do andar de cima, que tem três crianças. Achei-a incrivelmente mais gorda, desdentada e com ar desmesurado; parece que literalmente lhe passou um furacão pela vida estes dias. Perguntei-lhe se estão a precisar de alguma coisa e apenas reclamou que já não sabe o que fazer aos miúdos. Dou graças a Deus por a Maria ainda ser bebé enquanto passamos por isto; entre tantas questões a da escola parece-me que daria comigo em doida, eu que tenho a mania de pensar duzentas vezes nas coisas e achar sempre que se podia fazer melhor.
Começa a agigantar-se ainda mais o fosso entre ricos e pobres, à custa do CV19 alguns poucos estão a encher-se de dinheiro e outros literalmente a ficar sem ele, mas isso vê-se depois. A silly box está insuportável, já não entretém ninguém; as famílias já não conseguem disfarçar a falta que faz um programa lá fora. Depois disto vai haver tamanhas dificuldades mentais, que muitos acabarão por precisar de inventar vontade para voltar a sair. Outros vão correr para as ruas aos primeiros raios de sol que anunciem a primavera, em declarado modo rescue me.
Até fugíamos ou emigrávamos, mas para onde? Esta crise é diferente de todas as outras, pelas razões óbvias.
(...)

Para descontrair



É preciso.

Mea culpa

Eu votei neles, no governo das zaragatoas compradas à China, no governo dos presos à solta nunca pensei acabar a simpatizar tanto com o senhor Rui Rio, no governo do cebolo e das crianças desprotegidas.
Daqui a uns tempos vai ser vê-los pegados com os profissionais de Saúde, por causa das horas extra. Mas é bem antigo o ditado, zangam-se as comadres, descobrem-se as verdades.
(...)

The Oscar goes to

Gosto muito da personalidade Ricardo Araújo Pereira, gosto mesmo. Consegue transformar em humor criticas muito sérias e responsáveis. Vai directo ao pus na ferida, e só por isso deve haver muita gente que não partilha da minha opinião.
É preciso por o povo a pensar um bocadinho, e ele faz-lo da forma mais inteligente. Adorei que tenha passado um dos programas a comer pasteis esta foi só mesmo para quem chega lá.

Feira em Famalicão

Todos ao molhe e fé em Deus, vamos mas é comprar que a Páscoa é já a seguir.
Incrível a indiferença do ser humano perante tantas mortes, incrível o pensamento endeusado de que a mim nada me toca, impressionante a necessidade impressa em gente que tem tudo; e continua Portugal a vender e há quem compre, que somos os especiais na Europa a lidar com a situação cof cof.
O momento alto, aquele de que provavelmente nunca mais me vou esquecer, e com o qual vou personificar toda a gestão desta crise, foi quando perguntaram àquela senhora aparentemente octogenária, o que fazia ali no meio daquela enchente na feira, em tempos de COVID-19. Ao que ela respondeu, de forma simples e objectiva, como se fosse a coisa mais óbvia do mundo:
Eu vim por causa do cebolo.
(...)
As gentes mais simples podem muito bem não ter as ferramentas necessárias para gerir esta situação, às vezes é mesmo uma grande defesa viverem nos seus mundos-casulo.
Só não compreendo porque é que as feiras não estão interditas.

Realidade

Ás vezes, sobre a realidade, não se consegue escrever bonito.
Em Março já houve famílias com perda de salário no final do mês. Nas noticias passaram que 30% dos patrões na Hotelaria já não pagaram salários. Uma vergonha. Quase caso para pensar que o vírus deve estar a dar jeito a muita gente.
E depois pensar nesta gente em casa, com miúdos a esta altura já cheios de bichos carpinteiros no corpo, com as contas para pagar, sem alternativa a nível de emprego.
E isto ainda só agora começou...

Da minha ilha



O meu lugar ao Sol.

7

Está claro que nós não somos o vírus, que isto se vai resolver, que há muita competência e incompetência ao redor, que se calhar foram os chineses, que se calhar foram os americanos, que se calhar é só um vírus que surgiu, que no Peru e em África davam tudo para ter um confinamento tão difícil como o nosso, que uns se isolam, que outros passeiam, que só daqui a uns anos numa análise à História é que saberemos quem foram os certos e quem foram os errados, que enquanto tivermos profissionais de Saúde a trabalharem sem material de protecção não somos um máximo a lidar com coisa nenhuma, que parados empobrecemos, que nas ruas adoecemos, que algures na China continuam a comer pangolim.
(...)
E de repente um dos nossos fica seriamente doente; tão doente que o podemos perder.
Tudo o resto fica ruído de fundo.

Minha Maria e meu Luís



❤❤

Da minha bipolaridade

Estou saturada, confesso.
Ontem só me apetecia fugir para não sei onde, e chorar muito. Andei todo o dia estranha e de asa partida.
Hoje despertei com o compromisso familiar que o domingo impõe: vesti a minha capa de pseudo-superwoman e lá fiz o assado e dei muitos beijinhos à Maria e ao pai. Mais ou menos temos que nos segurar uns aos outros.
Dói-me a garganta e dói a garganta a toda a gente com quem falo. De forma irremediável, acabaremos por nos tornar numa sociedade autista e hipocondríaca. Vamos ter que respirar fundo muitas vezes depois disto. Vamos precisar de muitos dias de ar puro junto aos parques e ao mar, de muitos abraços bem apertados sob o risco de nunca mais serem a mesma coisa. Vamos ser obrigados a ajustar as nossas vidas, e as nossas formas de ser e de estar, porque agora que aconteceu, já sabemos que pode voltar a acontecer. Vamos inconscientemente procurar preparar-nos melhor, sob os alertas importantes do medo e da memória.
Vamos. Se conseguirmos fazer uma gestão individual e colectiva suficiente para vencermos este desafio. É por isso que nos dias não precisamos de almejar os dias sim, e nos dias sim mantermos a consciência de que hão-de sempre haver os dias não.
(...)

Gente assim

 A um Hospital em Espanha, inesperadamente chegou um camião repleto de material necessário para a luta contra o COVID-19. As equipas de trabalho correram para fora, em redor do camião, felizes por receber aquele enorme "presente".
Doação completamente anónima.

Os miúdos vão lembrar-se destes dias

Vão ter muitas saudades.
Chegam-me vídeos de familiares e amigos, das coisas mais lindas que pais e filhos têm feito estes dias. Bonecos de trapo com meias e botões, piqueniques no jardim de casa, jogar ao stop (quem se lembra?), participar nas tarefas de limpeza do lar; transformarem-se todos em pais-professores e filhos-de-professores, fazer pão e dar forma de peixe ou tartaruga à massa antes de a meter no forno. Fazer muitas coisas giras, juntos.
Parabéns Pais. Por no meio destes dias sombrios de angustias e preocupações, levarem o Sol a brilhar dentro de vossas casas.

Again and again



É tão importante ter um Amor. Nestes dias é o colo, a casa, o riso, a força.
Sinto-me, nos últimos dias, pouco inspirada pelos nossos governantes. Sinto que aqui e acolá se goza com o povo. E o povo anda meio milhafre ferido na asa.
Começo a ter conhecimento de casos de gente próxima, infectada com o COVID-19. E começo finalmente a perceber o que se tem feito ou se está a fazer. Uma inacreditável falta de organização.
Quanto ao nosso sistema de Saúde, antes da chegada do vírus já se esperavam horas para se ser atendido numa urgência (para alguns até morrer), já se esperavam meses ou anos para uma cirurgia ou consulta de especialidade, já os médicos nos atendiam em dez minutos que quase mal davam para um cumprimento empático (para os que ainda o sabem fazer), dizem alguns que já a linha de Saúde24 funcionava mal. Ninguém adivinhava que isto ia acontecer, mas a verdade é que nos apanhou descalços e nus.
Médicos e de enfermeiros têm sido louvados numa convulsão comum.; ando há dias para escrever sobre isto. Apesar de tudo os profissionais de Saúde estão a fazer uma coisa muito simples que desde ontem milhares de portugueses gostariam de também poder fazer: o trabalho deles. São remunerados e neste momento beneficiam da solidariedade do povo que lhes leva o pão fresco, os bolinhos e as refeições a custo zero. Estão privados das suas famílias por precaução, mas isto já estava previsto lá atrás no juramento de Hipócrates. Não se escolhe uma profissão nobre, é-se nobre na profissão. Certamente nem todos os cidadãos merecem os profissionais de Saúde que estão na chamada linha da frente, mas não tenho duvidas que nem todos os profissionais de Saúde merecem as palmas que lhes batem à noitinha nas janelas deste país. Neste país e nos outros, parece que já não se faz o bem sem a mão esquerda saber o que fez a direita, é preciso publicitar e muito; é preciso causar pena e chocar. É aí quando a vergonha também fica triste.
Faz muito tempo que os nossos profissionais de saúde se vão formando cada vez mais frios e mecânicos. Claramente esta situação é um choque para eles, mas também uma grande oportunidade de aprendizagem. Acho que estamos todos a viver uma altura importante para reflectirmos bem sobre algumas questões mais profundas.
Quanto à nossa classe politica, caiu entretanto no exagero do pavão. Ontem o senhor Costa foi ao programa da Cristina Ferreira, que eu não vi. Acho que não é hora, tenho a certeza de que tem tanta coisa bem mais urgente que fazer. Já para não falar nas constantes faltas que denunciam a ausência do rigor de um trabalho que nesta altura devia ser só sério: de manhã um diz põe máscara e de tarde outro diz tira máscara, entre outras inacreditáveis exposições de confusão e falta de conhecimento. Confesso que começa a aborrecer-me esta sensação de estarmos todos fechados num zoo, e eles passam e entretém-se a ver.
O simples facto de saber que as crianças desprotegidas vão ser devolvidas a casa de agressores, em nome da luta contra o vírus, para mim significa o fracasso social total e absoluto.
É o COVID-19 e mais um dos seus sintomas: uma valente confusão mental.
(...)

O grão da esperança

Ás sete horas da manhã o senhor padre, de uns setenta-oitenta anos, varria sereno todo o átrio da igreja. Observei-o naquele ritual de limpeza, preparação ou simplesmente cuidado.
É preciso continuar.