Expressão da minha terra que significa coisas tão diferentes e opostas como repugnância, enfado, surpresa, alegria, alivio, espanto. Expressão que me lembra a minha avó e me une à minha África-berço que não conheço. Uma palavra inteligente, que obriga a interpretar por inteiro a frase, incluindo a entoação e o sorriso ou a interrogação que dela fazem parte.
Novembro
Nasceu um menino muito especial.
O Tomé comove-me. Estávamos à espera dele há muito muito tempo.
(...)
22 de Novembro de 2023
Os meus 45 anos:
Comecei pelo milagre de estar viva.
Ganhei um dia muito frio, de céu azul e sol brilhante: os mais bonitos do ano para mim.
Tomei o meu café da manhã numa confeitaria que gosto muito, sozinha, sossegada.
Senti o cheiro das primeiras rabanadas de Natal á venda.
Ouvi nas noticias que Israel e o Hamas fizeram um acordo.
Comprei um presente para a minha filha.
Fiz uma caminhada a pé, em modo de oxigenar as ideias.
Estreei um abrigo quentinho.
Ganhei muitos beijos e abraços do meu Luís e da minha Maria.
Comprei uma coroa de Natal para oferecer.
Recebi presentes maiores: fotografias e muita emoção.
Senti que está tudo certo.
Fiz só o que gosto, e com tempo.
Ganhei flores, das minhas preferidas: tulipas e girassóis.
Às pessoas - as minhas pessoas - a minha gratidão profunda por me fazerem tão feliz neste meu dia.
Obrigada Sara
Sobre o nosso mundo
Não acho que esteja a evoluir, acho só que se vai diversificando cada vez mais, com a palavra diversificar a ter para mim cada vez menos importância ou destaque. Não acho graça a concursos de beleza que sempre foram só sobre a mulher, deixarem de o ser. Não encontro vertente educativa ou outra qualquer de interesse, em ter programas da manhã na televisão a entrevistar com destaque casais abertos numa quase promoção direta do tão em voga poliamor. Não percebo nem quero perceber gente que se intitula de jornalista e atropela o respeito perseguindo pessoas de pijama na rua a passear o cão ou a levar a filha à escola; e não, não foram só os jornalistas do costume, há tantos na praça que hoje em dia se vendem por duas moedas, que até o Judas se vendeu por trinta. E não, não sou fã de Galambas nem afins. Não contrataria para meu governo ninguém com piercings nas orelhas e acho péssimo comparecer a uma reunião com o Presidente da Republica de calças de ganga e sapatilhas. Parece que de repente é tudo uma cambada de fixes. Morria de vergonha se a minha filha um dia adolescente andasse para aí a atirar tintas verdes à cara de ministros ou quem quer que fosse, ou destruísse obras de arte, a titulo de salvar o planeta. Acho que jovens inteligentes brilham de outra forma. Acho estranho e triste pessoas que tratam melhor os animais do que as pessoas; é só preciso tratar bem os animais, mais nada. Assusta-me ver a imagem de meninas de 12 anos tão sexualizada, como se a sensualidade fosse uma coisa de repente tão inocente. Este é cada vez mais um mundo cão, sem eira nem beira, onde algumas liberdades são para mim só bandeiras perigosas. Um mundo tão estranho onde aceitamos tudo menos que haja uma opinião diferente da nossa, que ao mesmo tempo a medo muitas vezes já nem sequer podemos expressar. Mas são só coisas minhas, venham as balas que eu posso bem com elas.
Procuro educar a minha filha na aceitação da diferença, seja ela qual for, numa perspetiva de igualdade e respeito. Mas oxalá ela tenha ideias próprias e não me cresça só uma miúda parvinha e acéfala. Eu sou na verdade conservadora. E gosto de o ser, cada vez mais. Esta semana vi que agora é cool e muito à frente, em vez de ter a Nossa Senhora o o S. José no presépio, ter duas figuras masculinas. Mas onde é que isto vai parar? Nem sequer tenho já pachorra para um mundo tão dolentemente inclusivo. Dói o cotovelo, dói? Passa nívea! Tanta coisa realmente importante para ser discutida e o mundo distraído a jogar ao berlinde.
Sobre a importância das tradições em familia
Quero um dia ser uma mãe natal. Como tem sido a minha mãe toda a vida. Daquelas que fazem rabanadas, filhoses, aletria, roupa velha. Daquelas que três dias antes do natal já estão com a cozinha on fire e só cheiram a canela. Daquelas que decoram a casa porque é preciso, porque só assim é que é natal. Daquelas que colocam no pinheiro bolas de 1975. Das que se esmeram na toalha de mesa na noite de natal. Das que têm umas festas só lá de casa, tão lá de casa que no ano novo é tradição haver um divino arroz de miúdos de cabrito. Das que não deixam nunca morrer as tradições.
Ainda sou daquelas que chegam e sentam-se à mesa, só. Mas aos quase 45 começo a sentir que morro se um dia isto tudo se perder. A minha mãe e a minha sogra não são eternas, e em linha contrária a minha filha cresce. Cabe-me a mim, num dia próximo, tomar as rédeas. Porque inevitavelmente vou ser eu a mãe natal das memórias da Maria. E se hoje o natal pode ser tão prático que se compra tudo feito, não sou capaz de ser tão moderna. A cozinha é o coração da casa, e o amor é o tempo que gastamos a preparar tudo para os nossos. Os vapores dos cozinhados a engrandecerem a aura da casa, os cheiros, a musica de fundo, a escolha do melhor azeite e do melhor vinho do Porto, as luzinhas bem bregas a piscar, é nesses detalhes que se escondem as grandes memorias dos corações mais felizes e quentinhos.
É desta que começo a escrever as minhas Christmas recipes. Enquanto as verdadeiras autoras ainda cá estão para me ajudar. Vou por isto na minha agenda para fazer com a minha mãe nas próximas férias juntas.
Para depois do Natal, assim lá para 2024
Fazer férias longe, na praia, de papo para o ar, a beber cocktails giros e bons. Pode ser com o dinheiro do euromilhões, mas já ficava feliz com um show me the money.
Mudar de casa, para uma mais gira, mais nova, mais bem localizada, mais segura, e minha. Aqui mexia-se no euromilhões também.
Ter cash de sobra para uma senhora a dias tomar conta desta casa. Pois claro.
Massagens ao domicilio, dia sim dia também.
Nunca mais cozinhar, e só comer coisas boas.
Oh pá, levar a becas à Disney!
Aos 45? Se fosse um euromilhões dos bons, nunca mais trabalhar! Cansada de aturar pessoas.
Ver um concerto intimista do Matisyahu, com o meu Luís. Nós os dois sozinhos, bem longe do mundo.
(...)
De maneiras que o comum mortal é feliz também enquanto sonha.
Isto de ser mãe
No meu caso é dureza. Mais ou menos uma bela crise existencial PERMANENTE. A minha filha é um doce, uma linda, um amor de menina. Faz asneiras normais: esta semana mordeu no pai e disse que está farta desta merda toda. Quase desmaiei. Hiperventilei para dentro e acabei a pensar nos meus erros com ela. Nas minhas falhas diárias. Na bula que os miúdos não trazem. Na minha falta de vocação para a coisa. Enfim, ando aqui entalada.
Não sou uma mãe fixe, daquelas que brincam, que fazem bolos com os miúdos, que não se importam nada com a desarrumação na casa. Também não sou uma mãe-policia. Mas sou, entre as duas coisas, uma mãe cansada. Que é mais ou menos aquilo que uma mãe não tem direito, não pode, não deve, ser estar ou ficar cansada. Sou por isso muitas vezes, uma mãe chata.
Se calhar um dia o puzzle ganha forma. Até lá vou crescendo com ela. E sim é verdade, muitas vezes crescer dói.
De maneiras que é isto
Se nos misturarmos muito com o bolor alheio, de alminhas mais escuras que o breu, acabamos por sentir o cheiro a mofo em nós. Não dá para preservar o lado zen da pessoa quando na verdade a vontade era de distribuir quatro pares de estalos à mesma criatura, mal ela abre a boca logo na primeira aparição após dez dias sem termos tido contacto. Não dá, santos que não se cruzam não devem frequentar a mesma praça. Vai daí que se calhar esta que está aqui começa a ponderar ir arejar para outros bailes.
E pensar que meio mundo traz terços pendurados ao pescoço. Deve ser mesmo para se protegerem daquele dizer dos mais velhos que diz que aqui se paga tudo, deve ser com o medo da resposta do universo sobre o mal gratuito que fazem aos outros.
Arre!, é tomarem sol na moleirinha e desaparecerem-me da vista!
Adenda ao post anterior
Descobri estes dias, os três em casa e a chuva lá fora, que somos as pessoas mais felizes do mundo. Acima de tudo, sabemos que não é pouco estarmos vivos e estarmos juntos. Também sabemos que não vai ser sempre assim e talvez por isso o que temos agora é tanto para nós.
Na missa o senhor padre disse: É preciso sabermos que a Paz que buscamos não consiste apenas na inexistência de guerras. É com esta honestidade e frontalidade que queremos continuar a construir os nossos dias.
Formação profissional
Começa a ser regra, que antes de terminar o ano, para não fechar o livro em branco, faço pelo menos uma formação na Ordem. E fiz, durante estas férias forçadas em casa.
Mas devo dizer que todas essas coisas que aspirei a nível profissional, já não são tão importantes. A minha vida conduziu-se de outra forma, se calhar porque me faltou sorte ou garra. Mas não importa tanto agora, porque a verdade é que sinto que estou no lugar onde tenho que estar.
Feliz com os desafios que Deus me tem posto no caminho.
E hoje quando saí
Abertura oficial da época mágica
Nunca soube porque tinha duas árvores de Natal. Tinha por ter; quando comprei a segunda foi num acto irrefletido de insana atração irresistível. Digo em minha defesa que ambas são pequenas e discretas. Este ano é o primeiro ano de consciência plena da Maria, sobre o que é o Natal. Enquanto tirava as caixas com os enfeites dos arrumos, ela em alta voz fez de uma interrogação uma regra nova nesta casa:
Mãe, tive uma ideia! Vamos fazer a árvore de Natal no meu quarto?
E assim, uma década depois, a peça do puzzle encaixou: temos duas árvores de Natal porque uma é do quarto da Maria.
Férias forçadas
A miúda apanhou uma daquelas doenças do vasto rol dos contágios do leque quase interminável de doenças típicas de qualquer infantário que se preze. E porque a realidade é esta e não outra, quem mesmo é que tenta solucionar? Isso mesmo, a Shrec da mãe! Ou era a baixa ou eram as férias, calharam as férias. Vai daí que tivemos as duas uma semaninha de regabofe de naninhas agarradas uma à outra. Muitos mimos - o pai sempre a trabalhar mas mimou-nos tanto às duas que até eu me senti com privilégios de doentinha - muitas brincadeiras, desenhos, musicas novas, ver vezes sem conta os nossos episódios preferidos da Bluey, contar e aprender a lenda de S. Martinho, e decorar a casa para o Natal. Aproveitamos e fizemos tudo, para o restinho que falta de ano ficar mais levezinho.
E sem querer, descansei a sério. Ás vezes basta isso para ganharmos horizonte, mas nos apaixonarmos de novo, para ganharmos fôlego e vontade. Para percebermos a imensa sorte que é nossa, todos os dias.
Para os contentes
O Miguel chamou-lhe Um dia negro e acho que não há mais a dizer:
"No jornalismo aprende-se a redigir as notícias começando-se por resumir o essencial numa frase de abertura, a que se chama lead. No caso de notícias pouco importantes ou relativamente a situações ou países pouco importantes, o lead é curto e directo ao assunto. Na imprensa internacional de referência, o que aconteceu quarta-feira em Portugal resumiu-se a um simples lead: “O Governo português — um dos raros na Europa de maioria absoluta — caiu na sequência de o primeiro-ministro e algumas pessoas do seu círculo próximo terem sido alvo de abertura de processos-crime por suspeitas de corrupção nos projectos relativos à transição energética do país.”
E assim, curto e grosso, o país viu-se sumariamente enxovalhado e na lista negra de lugares onde seja saudável e prudente investir. De caminho, também e para efeitos internos, interrompeu-se a meio uma legislatura de maioria absoluta, atirou-se ao lixo um Orçamento prestes a ser votado e várias medidas urgentes e úteis para as pessoas dele constantes, interromperam-se as inadiáveis negociações com os médicos e a reestruturação do SNS, paralisou-se a execução do PRR e lançou-se em Bruxelas a suspeita sobre a boa aplicação dos seus dinheiros, aplicou-se um golpe de consequências ainda imprevisíveis na política de transição energética essencial a um país sem petróleo, gás ou centrais nucleares, mais uma vez protelou-se a escolha sobre o novo aeroporto de Lisboa, deixou-se a gestão governamental suspensa num momento em que paira uma recessão no horizonte, soltou-se, ufano, o populismo e a descrença nas instituições no ano das celebrações do 25 de Abril e devolveu-se a praça a alternativas forçadas que não existiam por si há três dias."
Miguel Sousa Tavares, in Expresso, 10 Novembro 2023
3 aninhos e esta compreensão
Vimos há dias na televisão a imagem de um menino, de uns 7 ou 8 anos, a chorar e a gritar desesperado, enquanto falava de vingança e contava que tinha ajudado a transportar um corpo decapitado.
Sem queremos a Maria assistiu, e mesmo não lendo as legendas, naquele instante ela ficou tal como eu, perplexa a olhar para o desespero daquele menino palestino. E depois seguiram-se algumas perguntas.
Depois de irmos fazer outras coisas, encontrei a Maria de joelhos a por qualquer coisa debaixo da porta de entrada da casa: "É uma carta mamã! Escrevi uma carta àquele menino, para ele não ficar triste, que ninguém vai matar a ele e aos papás dele."
E era esta a carta: um desenho. Onde as mãos, o olhar e a boca, mostram que ela viu o mesmo menino triste e desesperado que eu vi. E que ficou preocupada com ele.
"Mãe porquê que os homens fazem a guerra?"
Ainda não são preocupações para a tua idade filha, nem eu queria que fossem nunca preocupações para ti ou para qualquer outra menina ou menino no mundo, em idade nenhuma.
(...)
Preciso de descobrir novos sonhos
para substituir aqueles que me foram morrendo no caminho. Porque acredito que é o que alimenta o ser humano, a ilusão dos sonhos. É uma espécie de chama acesa.
Novembro
O meu mês. O meu virar de página, de ano. O meu ano novo.
Importa dizer que quero mudar. Por dentro e por fora. Contrariando a tendência e os gurus, quero ficar mais calma por dentro e mais bonita por fora. Como quase tudo implica tempo e ou dinheiro, não são mudanças fáceis nem imediatas. Mas quero mudar e importa saber com certeza que quero mudar.
Fundamental: continuo um processo de não carregar com o alheio. Ultimamente tem sido difícil porque estou num ponto do caminho em que me sinto a abandonar pessoas, porque não consigo dar-lhes nada meu agora, nem um sorriso; porque acho que se lhes der esse sorriso me desintegro. Estou à beira de uma crise profunda de certezas, mais ou menos num barco meio à deriva e não, não consigo empreender esforços em mais nada que não seja ficar presa ao leme.
Novembro é um bom mês para cuidar de mim.
Natal à porta
Não tenho vontade nenhuma de Natal, mas tenho muita vontade de ter vontade de Natal. Acho que está tudo tão cinzento à nossa volta, que é preciso contrariar. Espalhar luzes, risos, amor.
(...)