Nós e a pandemia

Cá em casa os dias têm sido de algum nervoso miudinho. A tempo inteiro com a Maria dou comigo a pensar nas mulheres de antigamente; que não tinham um emprego, eram exclusivamente cuidadoras do lar e da família. Aquele que continua a ser nos dias de hoje o papel mais importante na vida de uma mulher, por si só, é redutor. Eu dou em louca neste ram-ram de casa-cozinha-Maria. 

Casa de ferreiro, espeto de pau. Verdade verdadinha. A Maria tem tido umas reações menos próprias com as pessoas do nosso entorno. Aquilo que inicialmente pensei ser alguma ansiedade de separação típica de um período de desenvolvimento normal, considero agora que são apenas reflexos da vida de uma criança confinada. Numa tentativa de estimular a adaptação gradativa a pessoas desconhecidas - que por causa da pandemia interrompemos abruptamente - ontem levei-a comigo ao supermercado. A minha filha não é empática, não é simpática, e vai tendo uma ou outra reação de bichinho assustado, coisa que confesso me tira o sono. Acabo por lhe repreender o choro inconsolável e esqueço-me que é só do meu colo e da segurança que ele lhe transmite, que ela precisa. Por outro lado anda a viver este binómio de redução da relação umbilical comigo e intensificação de uma relação triangular na qual o pai tem sido o protagonista. Dá gosto ver como se amam aqueles dois, é puro e genuíno o entusiasmo dela quando sente a chaves do pai na porta, na hora em que ele regressa a casa. Mas de resto eu continuo sozinha com as fraldas e os biberões, e só me apetece gritar e fugir. Sem sequer ser razoável estar para aqui a queixar-me, uma vez que quem está em casa, afinal, sou eu. Lido mal com a chamada hora da bruxa (arsenic hour), que acontece no final do dia quando ambas estamos exaustas e com stress acumulado. E ele chega e também só quer descomprimir de um dia duro de trabalho. Ficamos os três meio à toa e eu afogo-me nesta péssima sensação de andar ainda à procura de conforto neste meu papel de mãe.

Tudo isto tem servido para perceber o que é de facto essencial. A minha filha precisa de apanhar sol, de correr nos parques, de rebolar e rir alto fora de casa. Eu preciso de por ela, nunca mais desperdiçar um só dia de luz.

(...)

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