Expressão da minha terra que significa coisas tão diferentes e opostas como repugnância, enfado, surpresa, alegria, alivio, espanto. Expressão que me lembra a minha avó e me une à minha África-berço que não conheço. Uma palavra inteligente, que obriga a interpretar por inteiro a frase, incluindo a entoação e o sorriso ou a interrogação que dela fazem parte.
Do Mar
Ela já aprendeu a rezar a Yemanjá. Já sabe oferecer presentes com o coração. Fez sozinha o seu primeiro castelo de areia.
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Desabafo
Não me posso queixar da vida. Deus tem sido absolutamente generoso comigo. Eu muitas vezes não encontro a alegria dentro de mim, não reajo com gratidão aos dias de adversidades e maior cansaço. Deixo-me cair pela exaustão de muitas horas de sono em débito, por uma casa que não consigo organizar, por uma mesmenhice dos dias que me incomoda e desencanta, por tantos à minha volta para quem eu não tenho mais a mesma energia e paciência.
Estou numa fase da minha vida em que sinto que caminho com uma mala de viagem aberta. E vou perdendo bagagem no caminho, e vou procurando ficar mais leve, à força de sobreviver.
História de Amor
Eu gosto de absolutamente tudo na minha filha. Menos um bocadinho da teimosia dela. Mas até da teimosia dela eu fico com saudades quando passamos um dia inteirinho sem estar juntas. E de tudo o que eu mais gosto, bem lá por cima, está a alegria genuína dela. É uma coisa que me comove, que me cativa. Ser mãe de uma criança feliz até quando dorme, é o maior estatuto que alguma vez poderia querer alcançar na minha pequena existência. E tudo o que eu aguento ou não aguento, é por ela.
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Flash
Flash
Quase S. João
A minha festa preferida de outros anos, de outra vida. Este ano nem vou perceber que acontece, vou estar a trabalhar. É uma euforia tão bonita, de uma noite em que todos se juntam na rua, e os cheiros e sons são genuínos e inconfundíveis. Gostaria muito de ensinar à Maria a importância de ser-se assim alegre, desde pequenina. Mas digamos que este é o primeiro S. João dela consciente, e eu não vou estar presente.
A verdade é que já não tenho folia.
Mais magra
Sem dietas. Sem grandes façanhas interiores. Sem mezinhas milagrosas em forma de comprimido. Sem sequer dar por ela.
O stress dos dias tem-me comido viva.
Sinto-me de regresso
Não sei de onde, mas de muito muito longe. De algum lugar espiritual mais dentro, onde tenho estado em guerra comigo mesma.
Têm sido dias, semanas, de gotas de água a fazerem transbordar o copo. Sei que sou eu desta vez, quem não está a saber viver com sabedoria e gratidão. Vivo constantemente exausta e com esta sensação de asfixia, sempre sem tempo para nada e a lidar muito mal com isso. Sempre a sentir-me em falta por não poder atender a tudo e a todos. Intragável para quem tem que conviver comigo. Talvez seja altura de crescer, e de me por a mim e a eles os dois, em primeiro lugar para sempre. Talvez não seja tão importante responder às mensagens dos amigos ou ter tempo para eles; talvez deva assumir que me aborrece solenemente gastar horas inteiras ao telefone a ouvir a minha mãe falar-me da vida dos meus irmãos; e talvez isso e mais quatro coisas sejam só mais uma aprendizagem tardia mas importante. A verdade é que tenho saúde, tenho emprego e tenho o mais importante: a Maria e o Luís. Todas as circunstâncias ao redor, tenho que aprender a minimizar.
De resto preciso de dormir manhãs inteiras e esquecer compromissos. De estar sozinha e em silêncio. De ler. De cozinhar com amor para a minha gente cá de casa. De voltar às massagens e às caminhadas. É um tempo meu que não volta mais.
Aliviar a minha bagagem; preocupar-me um bocadinho menos com os outros. Não me preocupar de todo, se for preciso.
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